O Instituto considera, ainda, que a aprovação da reforma tributária poderá reduzir a produção nacional e concentrar a indústria editorial nas grandes editoras. No manifesto, a entidade alerta que tal concentração, conforme apontam dados da Câmara Brasileira do Livro, prejudicaria “um contingente de 27 milhões de brasileiros das classes C, D e E, consumidores de livros, justamente a população mais vulnerável”.
Leia na íntegra o manifesto de repúdio:
Mais livros, menos armas: a tributação de livros é inconstitucional
Como instituição propagadora da cultura e da educação, e sempre na defesa dos direitos constitucionais esculpidos nos artigos 6º, 150, VI, d), e 205, o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) manifesta seu total repúdio ao projeto de reforma tributária que, a um só tempo, pretende acabar com a imunidade tributária de livros e do papel destinado à sua impressão (artigo 150, VI, d) e revogar parte da Lei 10.865/2004, que isenta a indústria do livro do pagamento de PIS e Cofins.
O Ministério da Economia, em mais uma bravata, afirma que os livros são “produtos de elite”, porque somente consumidos por ricos. Na realidade, o governo tenta outra vez desviar a atenção da população dos temas econômicos relevantes, como, por exemplo, a fome, escondendo a sua incapacidade de oferecer saídas à crise trazida com a pandemia.
O projeto despreza os programas de incentivo à leitura que, por sua vez, consagram há muito tempo os direitos às liberdades individuais, como os de expressão e acesso a fontes de informação, à educação e à cultura.
Ao propor, por meio do PL 3.887/20, substituir a isenção infraconstitucional por uma Contribuição sobre Bens e Serviços de 12%, afeta boa parte da indústria de livros em um momento muito difícil do mercado.
Com a substancial redução da produção nacional, a indústria editorial ficaria concentrada nas grandes editoras. Tal medida, segundo a Câmara Brasileira do Livro, atingiria diretamente um contingente de 27 milhões de brasileiros das classes C, D e E, consumidores de livros, justamente a população mais vulnerável, bem como a mobilidade social.
Não nos surpreende o retrocesso histórico que se pretende impingir com a aprovação do projeto pelo Legislativo, sendo certo que a economia do livro vem sofrendo notório desmonte (agravado na pandemia da Covid-19), ademais do claro ataque à pluralidade de pensamento e cultura do País.
Livros não são privilégio de ricos ou pobres, mas instrumentos de formação intelectual, cidadania, educação e liberdade de expressão.
Mais do que isto, entende-se que, sob a ótica da economia, prejudica-se uma indústria que tem apoio fiscal em várias partes do mundo. Na contramão de países civilizados e próximos, como Portugal. Destaque-se o caso da vila de Celorico de Basto ao Norte, uma das mais pobres daquele país, com baixíssimo índice de consumo, que a construção e incentivo a uma biblioteca ajudou a tirar do anonimato, alavancando a economia, segundo matéria jornalística recente.
Como afirma o presidente português Rebelo de Souza, “quem lê mais escreve mais e melhor”. A leitura “marca o começo da vida”.
A aprovação de uma reforma tributária nesses moldes, contrariando a Constituição Federal em vários dispositivos, provocará o seu questionamento através dos mecanismos de controle de constitucionalidade perante o STF, que vem, há décadas, assegurando o sentido teleológico da imunidade tributária, recentemente estendida aos livros digitais.
A “nova contribuição” constitui mais uma política retrógrada e autoritária nos segmentos da pesquisa, ciência, educação e cultura. Segmentos esses que são vistos pelo governo como inimigos do projeto traçado de desmantelamento de políticas públicas e direitos sociais do estado brasileiro.
Trata-se, em suma, de mais uma atitude emanada de um governo que tem como política a concessão de benefício fiscal às armas, incentivando sem o menor pudor a violência, em detrimento da imunidade, da isenção tributária de livros, em um país carente de cultura e com ineficiências enormes no sistema educacional, agora escancarados e agravados pela pandemia.
Resumimos a iniciativa do governo como não aceitação do pensamento crítico e que, segundo Umberto Eco, nas suas lições sobre o fascismo, significa que a crítica ou o desacordo é base do avanço do conhecimento científico: “A divergência, sob esta ótica, seria como uma traição”.
O IAB permanecerá, portanto, atento na defesa das liberdades constitucionais, não transigindo, como de costume, com iniciativas legislativas contrárias à educação, à cultura e à ciência, repudiando a proposta do Ministério da Economia, mais uma a aprofundar a desigualdade social e macular o investimento intelectual no futuro do Brasil.
Rita Cortez
Presidente nacional do IAB
Sydney Sanches
2º vice-presidente do IAB
Presidente nacional do IAB
Sydney Sanches
2º vice-presidente do IAB