O valor da contribuição feminina e os desafios enfrentados pelas mulheres na arbitragem marítima também foram discutidos no webinar, conduzido pela presidente da Comissão de Mediação, Conciliação e Arbitragem do IAB, Adriana Brasil Guimarães. Ela destacou que o campo, que é muito importante para o comércio, tem sido historicamente dominado por homens. Segundo a advogada, ao longo das últimas décadas, esse cenário tem mudado e a presença feminina no setor passa por um aumento significativo em todo o mundo. “É importante lembrar que a diversidade é fundamental para aprimorar a tomada das decisões e gerar inovações. É nesse sentido que a presença de mulheres é essencial para trazer novas perspectivas e experiências para o campo da arbitragem marítima”, destacou Guimarães.
O evento também teve a participação da diretora executiva da Câmara de Mediação e Arbitragem da FGV, Juliana Loss de Andrade; da 1ª vice-presidente da Comissão de Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário do IAB, Camila Mendes Vianna Cardoso; da advogada e professora da PUC-Rio Verônica Holzmeister; da conselheira adjunta da Corte Internacional de Arbitragem do ICC, Verena Waisberg; da professora da FGV Fabiane Verçosa; da vice-presidente executiva do Syndarma e da Abeam, Lilian Schaefer, e da professora da PUC-Rio e consultora nacional e internacional Nadia de Araujo. As mediações foram feitas pelo membro da Comissão de Mediação, Conciliação e Arbitragem do Instituto Olympio Carvalho e pelo membro da mesma comissão e vice-presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ), Hélio Paulo Ferraz.
No primeiro painel de debate, intitulado A visão das mulheres nas Câmaras de Arbitragem, as palestrantes compartilharam dados que constroem o cenário atual da presença feminina no setor. De acordo com Camila Cardoso, no Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem os homens ocupam 70,6% das posições de árbitro. Apesar da minoria expressiva, o Brasil ainda sai na frente de outros países desenvolvidos. Em Nova York, na Society of Maritime Arbitrators (SMA), os homens são 67 dos 72 árbitros. “Está melhor do que internacionalmente, mas está bom? Para mim não! Ainda podemos melhorar. A Diretoria de Arbitragem do CBMA tem seis homens e duas mulheres e a Diretoria de Mediação, essa sim, tem apenas dois homens e quatro mulheres”, contou Camila Cardoso.
O cenário é parecido na Corte Internacional de Arbitragem do ICC, segundo a conselheira adjunta da entidade, Verena Waisberg. No escritório de São Paulo, as mulheres são um pouco mais de 30% dos árbitros ativos. “Pretendemos crescer esse número não só em diversidade de gênero, mas sempre buscamos fomentar a diversidade regional, etária e de experiências”. A advogada também afirmou que o progresso dos números de hoje já é uma sinalização positiva. Além da participação feminina nas arbitragens em si, o posicionamento de mulheres em cargos de liderança também precisa apresentar crescimento, afirmou Juliana Loss. Na Câmara da FGV, da qual a advogada é diretora executiva, as mulheres ainda são minoria entre os árbitros, mas têm ganhado oportunidades na direção.
“Nos 30/40 anos, quando ficamos mais velhas, sobretudo depois da maternidade, deixamos de ocupar posições de gestão e galgar postos no Judiciário, na arbitragem e nas empresas”, lembrou Loss. Segundo ela, a luta pelo aumento da presença no setor também passa pela escolha das líderes. Dentro das metas da FGV, a igualdade de gênero na Câmara deve ser conquistada nos próximos dois anos. “É muito interessante ouvir a voz das mulheres na arbitragem. Essa é uma área tradicionalmente muito masculina, mas que está mudando e esperamos que mude ainda mais”, finalizou Olympio Carvalho. Como academia, o IAB, segundo Hélio Paulo Ferraz, deve se ocupar de problemáticas sociais como essa. “É aqui o fórum adequado para se discutirem essas questões de fundo, as raízes e o que há por trás de toda discussão jurídica”.
Da esq. para a dir., Nadia de Araujo, Lilian Schaefer, Hélio Paulo Ferraz, Adriana Brasil Guimarães, Verônica Holzmeister e Fabiane Verçosa
A arbitragem na indústria naval – No Direito Marítimo, a arbitragem tem um papel ancorado na resolução de conflitos que se dão historicamente. De acordo com Nadia de Araujo, foi na Inglaterra do século XIX que a indústria naval se desenvolveu e os contratos começaram a ser fixados nas negociações comerciais. “Nesse momento é que você tem as cláusulas e começamos a conhecer sobre lei aplicável e jurisdição, por exemplo, ‘onde é que eu vou julgar isso?’ ou ‘que lei vou aplicar?’”, explicou a consultora, que abriu o painel A visão das mulheres na indústria marítima. Na época, as disputas entre as partes se davam para fazer valer a aplicação legal mais conveniente para cada. “Isso nos traz aos dias atuais na medida em que às vezes não é lembrado como as coisas se desenvolveram, mas elas se desenvolveram ancoradas no dia a dia”, afirmou Nadia.
Hoje, o setor mantém uma importância de destaque. No País, 90% da exportação acontece por portos. A grandiosidade do campo, segundo Verônica Holzmeister, promove um espaço de potencial crescimento da participação da arbitragem. “Hoje, existem disputas que acabam no Judiciário e que no meu entender encontrariam na velocidade e na eficiência da arbitragem um bom berço para serem levadas para as Câmaras com uma certa neutralidade”, afirmou a advogada. Ela também destacou que a mediação feita por profissionais com experiência direta no setor facilita a celeridade do processo. “Algumas disputas de Direito Marítimo são resolvidas só com documentos, sem a necessidade de um aprofundamento, e ter um árbitro com conhecimento técnico vai permitir isso”.
No processo de arbitragem, Fabiane Verçosa ressaltou a importância dos International Commercial Terms e explicou o papel deles. Os Incoterms são os dispositivos contratuais que determinam as obrigações e os direitos de cada agente na negociação comercial. Essas regras internacionais, explicou a advogada, funcionam como mecanismos de oferecimento de práticas mais neutras. “Por mais que eles ajudem em relação a alocação de riscos e os custos e obrigações entre comprador e vendedor, eles não trazem tudo o que é necessário. É preciso pactuar outras questões contratualmente”, lembrou.
Lilian Schaefer também destacou que a indústria marítima mundial tem se valido da arbitragem para resolução de conflitos como uma alternativa menos onerosa. Para ela, é possível perceber como o campo apresenta crescimento também na perspectiva de gênero. “É importante entendermos historicamente como a navegação vem se desenvolvendo, como cada vez mais as mulheres participam seja na operação, na construção ou na elaboração dos instrumentos contratuais”. Debater as nuances do campo através do olhar feminino, segundo a presidente da Comissão dos Direitos da Mulher do IAB,, Rita Cortez, é um avanço. “Vamos ressaltar a importância de ter uma mesa formada por mulheres, porque isso é a valorização da inteligência feminina em cada setor e área do Direito”.