O anteprojeto será encaminhado pela presidente nacional, Rita Cortez, aos presidentes da República, da Câmara dos Deputados e do Senado. Segundo Melhim Chalhub, “a blindagem de bens para os quais for dada uma destinação futura, em forma de herança, por exemplo, tornando tais bens autônomos e impenhoráveis em relação a dívidas, proporcionará uma segurança jurídica hoje inexistente no País”. Para o relator Gustavo Alberto Villela Filho, “com a transformação do anteprojeto em lei, haverá a segurança jurídica necessária para estimular investimentos, pois acabará com o risco de penhoras de bens desvinculados e desproporcionais ao volume de negócios”.
Além disso, de acordo com o relator, “a sociedade passará a contar com um eficaz instrumento para o planejamento sucessório e patrimonial”. Como exemplo, ele citou a provisão de recursos destinados a garantir a educação de filhos menores ou a tutela de um descendente com necessidades especiais, em caso de falecimento do proprietário dos bens.
Melhim Chalhub explicou que o anteprojeto de lei amplia a mudança promovida na legislação, há 15 anos, a partir de outro anteprojeto, também de sua autoria. Aprovado pelo plenário do IAB em novembro de 1999, o anteprojeto foi encaminhado ao Congresso Nacional e acabou se transformando, após longa tramitação, na Lei 10.931/2004. Ela alterou a Lei 4.591/1964, que trata das incorporações imobiliárias.
Desde então, segundo Melhim Chalhub, “as empresas podem segregar os riscos de cada empreendimento, criando um patrimônio de afetação, formado por um conjunto de bens impenhoráveis, para cada uma das suas incorporações”. O efeito da medida, de acordo com ele, é que “cada empreendimento é incomunicável com os demais para efeitos de falência ou recuperação judicial da empresa incorporadora”.
Bens desvinculados – Segundo Melhim Chalhub, com a mudança na lei, tais bens agora podem ficar desvinculados do patrimônio geral, “na prática e no direito”. Numa eventual condição de devedor, explicou o advogado, o incorporador imobiliário poderá evitar, se os tiver colocado como patrimônio de afetação, que sejam penhorados, por não guardarem relação com a dívida ou a falência decorrente de outro negócio.
De acordo com o autor, o novo anteprojeto, por meio do contrato de fidúcia, estende esse direito a pessoas físicas e a outras empresas, de quaisquer segmentos. “Ele amplia a possibilidade de criação de um patrimônio separado, com destinação específica, desde que lícita, às pessoas e empresas”, disse. Gustavo Alberto Villela Filho, por sua vez, destacou que o novo instrumento a ser introduzido na legislação brasileira é equivalente ao instituto anglo-americano do trust.
Segundo o relator, por meio do contrato de fidúcia, bens ou direitos são transferidos pelo proprietário (fiduciante) a uma pessoa ou empresa (fiduciário), que os administra para um determinado fim. Como exemplo, ele citou a iniciativa de segregar bens, com o objetivo de torná-los parte de herança para descendentes, evitando a sua penhora em quaisquer circunstâncias.
Gustavo Alberto Villela Filho disse ainda que, embora o projeto de lei do Senado (PLS) 487/2013, destinado à criação de um novo Código Comercial Brasileiro, tenha um capítulo dedicado à regulação do contrato fiduciário, o anteprojeto de Melhim Chalhub é mais amplo. “O PLS preconiza a regulamentação do negócio jurídico fiduciário apenas no restrito âmbito das atividades empresariais, enquanto o anteprojeto alcança as relações jurídicas em geral”, afirmou.
Interesse social – O advogado citou algumas situações abrangidas pelo anteprojeto e preteridas pelo PLS. “O texto envolve planejamento sucessório e proteção de pessoas com necessidades especiais, além de inúmeras outras situações de relevante interesse social merecedoras da tutela da segregação patrimonial típica da fidúcia”, disse.
Gustavo Alberto Villela Filho refutou a crítica de que a criação de patrimônio afetado, separado e autônomo poderia servir à prática de fraude. “Não se sustenta”, afirmou ele, ressaltando que a fidúcia é uma transmissão de propriedade e, portanto, está sujeita aos mesmos requisitos legais a que se submetem a compra e a venda, entre outros negócios de transmissão. De acordo com o advogado, o anteprojeto prevê mecanismos de defesa contra o uso da fidúcia em caso de prática de fraude ou até mesmo de lavagem de dinheiro. “Há, inclusive, severas sanções previstas para tais situações”, informou.
Ao defender o contrato de fidúcia, Gustavo Alberto Villela Filho citou trecho do capitulo sobre trust do livro Arquitetura do planejamento sucessório, de autoria de Milena Donato Oliva, membro da Comissão de Direito Civil do IAB, que estava presente na sessão ordinária. “O trust constitui negócio jurídico versátil”, escreveu a autora. Da tribuna do plenário, Milena Donato Oliva se manifestou sobre o assunto e disse que “hoje, na América Latina, o Brasil talvez seja o único país que ainda não adotou o trust ou a fidúcia, como prefere chamar o doutor Melhim Chalhub”.
Ainda na sessão, Chalhub destacou que o texto do anteprojeto integra a sua monografia intitulada Negócio Fiduciário, apresentada no curso de especialização em Direito Privado na Universidade Federal Fluminense (UFF), sob a orientação dos professores Caio Mário da Silveira Pereira, Luiz Roldão de Freitas Gomes e Diogo Leite de Campos.
Por fim, o autor do anteprojeto disse que o contrato de fidúcia visa a evitar riscos, como os enfrentados, por exemplo, pelos investidores do negócio que ficou conhecido como Fazendas Boi Gordo. Considerado um dos maiores casos de pirâmide financeira do país, o negócio levou cerca de 30 mil investidores a perderem cerca de R$ 3,9 bilhões.
“A operação de fidúcia serve para a defesa de investidores e poupadores, como no caso dos fundos de investimentos, em que os bens da carteira são de propriedade da sociedade administradora, em caráter fiduciário, para administrá-los exclusivamente em proveito dos subscritores das cotas”, finalizou.
OS MEMBROS DO IAB ATUAM EM DEFESA DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO. FILIE-SE!