Um grupo com seis ex-presidentes do Supremo Tribunal Federal, além de ex-procuradores-gerais da República e ex-presidentes da OAB encaminharam carta ao atual presidente do STF, ministro Dias Toffoli pedindo que a ampliação da competência do plenário virtual seja revogada. A medida foi aprovada em razão da pandemia do novo coronavírus, mas ex-integrantes da Corte avaliam que o recurso tem sido ‘largamente utilizado’ e apontam problemas relacionados à publicidade e à transparência dos julgamentos, além de questões relacionadas ‘aos princípios da ampla defesa, do devido processo legal e do contraditório’.
Como saída, os advogados destacam que os casos que demandem julgamento colegiado e que não se encontravam na competência anteriormente definida para o plenário virtual, poderiam ser analisados na sessão virtual, por videoconferência – medida também instituída em razão da crise da Covid-19. “Em tal modalidade de sessão, o julgamento se processa com a devida publicidade e ao vivo, com a presença simultânea dos eminentes julgadores, do Ministério Público e dos advogados da causa, que poderão se manifestar, com observância das normas processuais”, pontua a carta.
Entre os 130 advogados que assinam o texto estão os ex-presidentes do Supremo Sepúlveda Pertence, Carlos Mário Velloso, Francisco Rezek, Nelson Jobim, Ellen Gracie e Cezar Peluso, os ex-procuradores-gerais da República Aristides Junqueira e Antônio Fernando e os ex-presidentes da Ordem dos Advogados do Brasil José Roberto Batochio, Reginaldo Oscar de Castro, Ophir Cavalcante Júnior, Cezar Britto e Marcus Vinicius Furtado Coêlho.
Na lista, há ainda ex-ministros do TSE, como Luciana Lóssio, Marcelo Ribeiro, Carlos Eduardo Caputo Bastos e Henrique Neves, ex-ministros do Superior Tribunal de Justiça, como Gilson Dipp, ex-ministros da Justiça, como José Eduardo Cardozo.
A ampliação do plenário virtual foi aprovada em sessão administrativa do Supremo realizada no dia 18 de março. A ferramenta contabiliza apenas como votou cada ministro. As íntegras dos entendimentos, contudo, são divulgados posteriormente pelos gabinetes e adicionados ao sistema de acompanhamento processual.
A carta enviada a Toffoli destaca que o plenário virtual vinha sendo utilizado no julgamento de casos menos complexos, com deliberações não públicas e sem participação dos advogados, mas sinaliza hoje ‘todo e qualquer processo, inclusive os de maior relevo, tais como as ações que viabilizam o controle concentrado de constitucionalidade e recursos extraordinários com repercussão geral reconhecida, podem ser julgados em tal ambiente’.
No texto é lembrada da possibilidade desenvolvida pela corte de realização de sustentação oral gravada – medida implantada durante a crise do coronavírus -, mas o grupo que assina a carta alega que a participação do advogado nos julgamentos ficou ‘limitada a um documento eletrônico’.
Os advogados argumentam que a tecnologia deve ser utilizada em favor da celeridade processual e da eficiência na prestação jurisdicional, mas ‘sem ignorar os princípios da ampla defesa, do devido processo legal, do contraditório e da publicidade’.
“Cabe salientar que o julgamento, feito na forma tradicional do direito brasileiro, isto é, presencial e público, permite a formação do convencimento dos julgadores mediante debates. Muitas vezes, desses debates orais resultam a modificação da opinião dos Ministros. Essa Augusta Corte, que sempre tão bem acolheu os advogados, está acostumada a esclarecimentos prestados da tribuna, que influenciam as discussões e culminam, amiúde, na alteração de um posicionamento do Tribunal que parecia certo”, registra o texto.
Além disso, apontam que a simples divulgação do resultado do julgamento não atende a determinação constitucional de publicidade de todos os julgamentos.
Os advogados também ressaltam um problema de transparência. “Julgar questões de grande relevância, como, por exemplo, declarar a inconstitucionalidade de uma lei, sem que os advogados e a sociedade em geral possam acompanhar a formação da decisão, além de desprestigiar o princípio da publicidade, cria um sério embaraço à atividade advocatícia”, diz a carta.
CONFIRA A ÍNTEGRA DA NOTA
Excelentíssimo Senhor Ministro Dias Toffoli, DD. Presidente do Colendo Supremo Tribunal Federal
Os abaixo-assinados, todos advogados militantes perante essa Suprema Corte, vêm, com o devido respeito, manifestar preocupações a propósito da ampliação da competência do assim chamado “plenário virtual”.
É sabido que essa augusta Casa vem, há algum tempo, realizando julgamentos de casos menos complexos, nessa nova modalidade. Tais julgamentos não são públicos e não contam com a participação dos advogados.
Em razão da atual crise sanitária, essa Corte aprovou a Emenda Regimental nº 53/2020 e a Resolução 669/2020, que ampliaram consideravelmente a competência do plenário virtual. A rigor, todo e qualquer processo, inclusive os de maior relevo, tais como as ações que viabilizam o controle concentrado de constitucionalidade e recursos extraordinários com repercussão geral reconhecida, podem ser julgados em tal ambiente.
Para viabilizar a participação do advogado, estipulou-se a possibilidade da realização de sustentação oral gravada, que deverá ser encaminhada por meio eletrônico. A participação do advogado, portanto, ficou limitada a um documento eletrônico, que será incorporado aos autos. Mesmo nos casos mais relevantes, o advogado só poderá encaminhar a sustentação dessa forma, muito equivalente a um memorial, embora em audiovisual.
Essa nova forma de julgamento, embora recentemente criada, tem sido largamente utilizada pelos eminentes Ministros da Corte. Ações diretas de inconstitucionalidade, ações de descumprimento de preceito fundamental, entre outras classes processuais, estão sendo submetidas a essa modalidade.
É evidente que a tecnologia deve ser utilizada em favor da celeridade processual e da eficiência na prestação jurisdicional. Não podemos ficar aferrados ao passado, ignorando as possibilidades que os avanços, especialmente na área da comunicação à distância, proporcionam.
Deve-se, entretanto, promover alterações na forma da prestação jurisdicional, sem ignorar os princípios da ampla defesa, do devido processo legal, do contraditório e da publicidade. Não se deve olvidar, também, que o artigo 133 da Constituição afirma que o advogado é indispensável à administração da Justiça.
Um julgamento que não pode ser acompanhado pelo advogado enquanto se realiza; que não admite a interferência do advogado, seja para realizar sustentação oral ao vivo, seja para pedir a palavra para realizar esclarecimentos sobre matéria de fato, certamente não atende, data venia, aos princípios citados, nem prestigia o artigo 133 mencionado.
Por outro lado, o artigo 93, X, da CF, determina a publicidade de todos os julgamentos do Poder Judiciário. A simples divulgação do resultado do julgamento, a toda evidência, não atende a essa imposição constitucional.
Cabe salientar que o julgamento, feito na forma tradicional do direito brasileiro, isto é, presencial e público, permite a formação do convencimento dos julgadores mediante debates. Muitas vezes, desses debates orais resultam a modificação da opinião dos Ministros.
Essa Augusta Corte, que sempre tão bem acolheu os advogados, está acostumada a esclarecimentos prestados da tribuna, que influenciam as discussões e culminam, amiúde, na alteração de um posicionamento do Tribunal que parecia certo.
Há, ainda, o problema da transparência, sempre tão caro a essa Egrégia Corte. Julgar questões de grande relevância, como, por exemplo, declarar a inconstitucionalidade de uma lei, sem que os advogados e a sociedade em geral possam acompanhar a formação da decisão, além de desprestigiar o princípio da publicidade, cria um sério embaraço à atividade advocatícia.
Registre-se, nesse diapasão, que não se trata apenas de respeitar as prerrogativas dos advogados, expressamente previstas em lei, como a de esclarecer, em qualquer julgamento, matéria de fato. As prerrogativas aludidas têm como destinatário não o advogado em si, mas protegem o Estado de Direito. Conferem-se, aos advogados, certas prerrogativas, para que as pessoas em geral, naturais ou jurídicas, públicas ou privadas, possam relacionar-se com o Estado-juiz de forma equilibrada e clara, evitando-se o engrandecimento deste em face dos direitos daquelas.
Assim, tem essa por objeto solicitar à Vossa Excelência, eminente Presidente, a submissão do tema novamente ao plenário dessa Corte.
Pede-se que a ampliação da competência do plenário virtual seja revogada. Os casos que demandem julgamento colegiado e que não se encontravam na competência anteriormente definida para o plenário virtual, poderiam ser analisados na sessão virtual, por videoconferência, também prevista na resolução citada. Em tal modalidade de sessão, o julgamento se processa com a devida publicidade e ao vivo, com a presença simultânea dos eminentes julgadores, do Ministério Público e dos advogados da causa, que poderão se manifestar, com observância das normas processuais.
É o que, respeitosamente, se pede.
Esclarecem os peticionários que, em razão da pandemia, não foi possível colher as assinaturas. Confirmam, contudo, que estão de pleno acordo com o texto ora submetido a esta egrégia Corte.
Brasília-DF, 14 de abril de 2020.
José Paulo Sepúlveda Pertence
Carlos Mário da Silva Velloso
Francisco Rezek
Nelson Jobim
Ellen Gracie Northfleet
Antônio Cezar Peluso
Pedro Gordilho
Nabor Bulhões
Aristides Junqueira Alvarenga
Antônio Fernando Barros e Silva de Souza
Paulo Roberto Saraiva da Costa Leite
Nilson Naves
Eduardo Ribeiro
Fernando Gonçalves
Aldir Passarinho Júnior
Gilson Dipp
Hamilton Carvalhido
José Eduardo Cardozo
Eugênio José Guilherme de Aragão
Torquato Jardim
Grace Mendonça
Luiz Carlos Bettiol
Cândido Rangel Dinamarco
José Manoel Arruda Alvim
Roberto Rosas
Técio Lins e Silva
Marcus Vinicius Furtado Coelho
Eduardo Ferrão
José Alberto Couto Maciel
José Roberto Batochio
Reginaldo Oscar de Castro
Ophir Filgueiras Cavalcante Júnior
Cezar Britto
Celso Mori
Antônio Cláudio Mariz de Oliveira
Rita Cortez
Paulo César Pinheiro Carneiro
Nélio Machado
José Eduardo Alckmin
Fernando Neves da Silva
Luiz Carlos Lopes Madeira
Carlos Eduardo Caputo Bastos
Marcelo Ribeiro
Henrique Neves
Luciana Lóssio
Admar Gonzaga Neto
Antônio Carlos de Almeida Castro – Kakay
Alberto Toron
Antônio Meyer
Francisco Caputo Neto
Marco Antônio Mundim
Eugênio Pacelli
Marcelo Ferro
Daltro de Campos Borges Filho
Paulo Sérgio Leite Fernandes
Paulo Penalva Santos
Délio Lins e Silva Júnior
Luiz Alberto Bettiol
Luiz Antônio Bettiol
Marcelo Lavocat Galvão
Ticiano Figueiredo
Pedro Ivo Velloso
Luiz Vianna Queiroz
Teresa Arruda Alvim
Luiz Cláudio de Almeida Abreu
José Roberto dos Santos Bedaque
Carlos Augusto Sobral Rolemberg
Anna Maria da Trindade dos Reis
Joaquim Eugênio Goulart
Rodrigo Rocha de Souza
Cláudio Loureiro
Roberto Caldas Alvim de Oliveira
Aref Assreuy Júnior
Elias Mattar Assad
Denílson Fonseca Gonçalves
Mariana Moutella
Francisco Mussnich
Gustavo Tepedino
Renato de Mello Jorge Silveira
Márcio Vieira Souto Costa Ferreira
José Francisco Siqueira Neto
Marcelo Nobre
Maurício Dieter
José Diogo Bastos
Dora Cavalcanti
Flávia Rahal
Ana Teresa Basílio
Pierpaolo Bottini
Augusto de Arruda Botelho
Fábio Tofic Simantob
Leonardo Sica
Gustavo Fleichman
Sérgio Tostes
Fernando Serec
José Roberto de Castro Neves
Renato de Moraes
Cláudia Pavan
Gustavo Schmidt
Eduardo Schmidt
Marilda de Paula Silveira
Maria Cláudia Bucchianeri
Vicente Coelho Araújo
Alexandre Kruel Jobim
Alberto Pavie
André Silveira
José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro
Eduardo Uchôa Athayde
Carlos José Santos da Silva – Cajé
Cândido da Silva Dinamarco
Fernando Teixeira Abdala
Fabrício Juliano Mendes Medeiros
Rodrigo Badaró
Ângela Cignachi Baeta Neves
Jorge Lavocat Galvão
René Rocha Filho
Sidney Neves
Raquel Bezerra Cândido
Paulo Maurício Braz Siqueira
Evandro Pertence
Pedro da Silva Dinamarco
Wagner Rossi Rodrigues
Afonso Arantes de Paula
Cláudio Demczuk de Alencar
Márcio Silva
Guilherme Batochio
Daniela Teixeira
André Callegari
Sávio de Faria Karam Zukim
Cristiane Damasceno
Eduardo Arruda Alvim
Celso Sanchez Vilardi
Iran Machado Nascimento
FONTE: IstoÉ Dinheiro - 16/04/2020