“A tipificação do crime de desacato é rechaçada internacionalmente, por flagelar a liberdade de expressão e enfraquecer a prerrogativa do cidadão de fiscalizar as atividades dos agentes públicos.” Com este argumento, o relator Leonardo Monteiro Villarinho, da Comissão de Direito Penal do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), obteve do plenário da instituição, na sessão ordinária da última quarta-feira (23/10), a aprovação unânime do seu parecer, parcialmente favorável ao Projeto de Lei 2.769/2015, do ex-deputado federal Wadih Damous. O PL visa a revogar os crimes de desacato a militar e desacato a funcionário público, previstos no Código Penal Militar (art. 299) e no Código Penal (art. 331), respectivamente. A proposta sugere, também, a anulação integral da Lei de Segurança Nacional (LSN).
Leonardo Monteiro Villarinho acolheu a proposta de revogação do crime de desacato nas duas legislações, mas rejeitou a de tornar sem efeito a LSN. Segundo ele, “o tema não foi abordado pelo autor do PL com profundidade e análise pormenorizada dos dispositivos previstos na lei”. Ainda de acordo com o relator, a justificativa apresentada para a extinção da LSN se limitou ao “argumento histórico-constitucional” de que a lei foi promulgada durante a ditadura militar. “Isto não é suficiente para sustentar a revogação da norma”, afirmou.
A respeito do crime de desacato, Leonardo Monteiro Villarinho disse concordar com a indicação do ex-parlamentar, de que a sua tipificação violaria o art. 13 do Pacto de São José da Costa Rica, incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro, por meio do Decreto 678/1992. Conforme o art. 13, “toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão”. Ainda de acordo com o dispositivo, “esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda a natureza, verbalmente ou por escrito”. Para o advogado, “a manutenção da criminalização das condutas de desacato consubstanciam flagrante desrespeito ao Pacto de São José da Costa Rica”.
Tratados internacionais – O relator destacou também o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), de que as normas dos tratados internacionais de direitos humanos ostentam caráter supralegal. Ele citou, ainda, a decisão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que, em 2000, aprovou a Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão, segundo a qual “os funcionários públicos estão sujeitos a um maior controle por parte da sociedade”. Ainda conforme o documento, “as leis conhecidas como de desacato atentam contra a liberdade de expressão e o direito à informação”.
Leonardo Monteiro Villarinho mencionou também decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), para mostrar que a revogação do crime de desacato não desprotegerá os agentes públicos. Conforme decisão do STJ, “o afastamento da tipificação criminal do desacato não impede a responsabilização por calúnia, injúria ou difamação motivada por abuso na expressão verbal ou gestual dirigida a funcionário público”.
FONTE: Rota Jurídica - 25/10/2019