- O objetivo é desativar uma bomba-relógio jurídica que poderá ser detonada a qualquer momento nas cadeias do Rio de Janeiro e de outras cidades brasileiras, cada vez mais superlotadas de milhares de jovens, negros e pobres que, condenados com base somente na versão dos policiais que os prenderam, cumprem penas altíssimas, de cinco a 15 anos de reclusão - alertou André Barros.
De acordo com o advogado, na grande maioria dos casos, os presos são primários e foram flagrados desarmados, com pequenas quantidades de drogas e sem testemunhas que confirmem a narrativa dos policiais.
- Trata-se de uma aberração jurídica altamente temerária.
Segundo André Barros, o objetivo do sistema jurídico brasileiro, que equiparou o tráfico de drogas aos crimes hediondos, deveria ser a apreensão de grandes quantidades de drogas, armas e munições, como também o combate ao crime de lavagem de dinheiro praticado pelos traficantes internacionais no sistema financeiro e imobiliário. De acordo com o advogado, o sistema jurídico, formado pela Constituição Federal, a Lei 11.343/2006, conhecida como Lei Antidrogas, e compromissos internacionais assumidos pelo país, "não foi construído para prender usuários, pequenos intermediários e escravos desse mercado como traficantes de drogas".
Durante os debates que antecederam a aprovação do parecer do relator, a chefe de Gabinete da Presidência do IAB, Maíra Fernandes, integrante da Comissão de Direito Penal e ex-presidente do Conselho Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro, forneceu dados do estudo Tráfico e sentenças judiciais – uma análise das justificativas na aplicação de Lei de Drogas no Rio de Janeiro. Realizado pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro e a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), o estudo, concluído em janeiro deste ano, apontou que em 71,14% das condenações as únicas testemunhas dos processos eram policiais. Além disso, demonstrou que 77,36% dos réus não tinham antecedentes criminais e somente 20% foram absolvidos.
Ainda de acordo com o estudo, muitas das condenações tiveram como base o estabelecido pela Súmula 70, editada em 2003 pelo Tribunal de Justiça do Estado do Estado do Rio de Janeiro e duramente criticada por André Barros. Conforme a súmula, "o fato de restringir-se a prova oral a depoimentos de autoridades policiais e seus agentes não desautoriza a condenação". Para o relator, "os desembargadores, numa decisão unânime, buscaram dar um tom de legalidade às prisões sem provas por tráfico de drogas, fazendo valer, inquestionavelmente, a versão dos policiais".
André Barros destacou, também, os dados do levantamento feito em 2014 pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP). De acordo com a pesquisa, 67,7% dos encarcerados por tráfico de maconha no País foram flagrados com menos de 100 g da droga e 14% deles com menos de 10 g. "Mesmo com a Lei Antidrogas vigorando há quase 12 anos, não há até hoje um balizamento da quantidade de droga que diferencia o usuário do traficante", criticou.
Segundo o relator, "embora a lei estabeleça que a materialidade do crime é demonstrada pela natureza e a quantidade da substância apreendida, milhares de pessoas são condenadas com pequenas quantidades, já que nenhum tribunal brasileiro se dispôs a enfrentar a questão". Conforme André Barros, a única exceção foi o voto do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), que, no ano passado, no julgamento do Recurso Extraordinário 635.659, ainda não concluído, recomendou a aplicação do critério adotado em Portugal, onde a posse de até 25 g de maconha não é considerada tráfico.
O relator ressaltou, ainda, que os art. 28 e 33 da Lei Antidrogas mencionam 18 atos, dentre eles os de "importar, exportar, adquirir, transportar, guardar ou trazer consigo", com base nos quais, embora não exista mais a pena privativa de liberdade por consumo de drogas, qualquer usuário pode ser condenado pelo crime de tráfico. "Trata-se de um festival de verbos, fazendo do crime uma verdadeira indefinição", afirmou.
Ex-secretário de segurança do Rio, José Mariano Beltrame, defende legado das UPPs
A intervenção federal no setor de segurança do Rio de Janeiro abriu debate no segundo dia da LAAD Security, nesta quarta, sobre a eficácia das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) criadas pelo Governo do Estado em comunidades do município há alguns anos. Para o responsável pela implantação do projeto, o ex-secretário de Segurança Pública José Mariano Beltrame, a iniciativa foi um sucesso pois restabeleceu a esperança às pessoas que vivem em áreas conflagradas.
- Dizem que as UPPs não deram certo, mas é preciso falar para a sociedade que o que não deu certo foi o Rio de Janeiro e talvez o país - disparou.
Sobre a intervenção federal, Beltrame afirma que, enquanto existirem territórios dominados pelo crime, não haverá solução.
- De um lado está o estado democrático de direito e de outro um estado que é dominado por um déspota (ligado ao tráfico ou às milícias) que manda paralelamente. É necessário um direcionamento estratégico que transforme a cidade repartida em uma, com justiça e segurança.
Fonte:https://monitordigital.com.br/aprovado-pl-que-torna-nula-condena-o-por-tr-fico-baseada-s-em-vers-o-da-pol-cia