Após determinação do prefeito Marcelo Crivella, fiscais percorreram estandes do evento para apreender livros com temas ligados à temática LGBT
Órgãos ressaltam, também, que não cabe ao Poder Executivo municipal, e, sim, à Justiça da Infância e da Juventude, a ação contra eventuais desrespeitos ao ECA (Twitter/Reprodução)
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro e o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) criticaram, nesta sexta-feira, a decisão do prefeito da cidade, Marcelo Crivella de mandar recolher dos estandes o livro em quadrinhos Vingadores: A Cruzada das Crianças. Dois dos personagens são gays.
Na manhã desta sexta-feira, fiscais da Secretaria Municipal de Ordem Pública percorreram estandes da Bienal do Livro, no Rio de Janeiro, para tentar restringir a venda de livros com temas ligados à temática LGBT. Representantes da Secretaria Municipal de Educação avisaram livreiros e editoras que haveria a fiscalização. A prefeitura queria que os volumes sejam lacrados e apresentados como sendo de conteúdo impróprio.
“A tentativa de recolhimento da obra em quadrinhos Vingadores: A Cruzada das Crianças, sob o argumento de que violaria o Estatuto da Criança e do Adolescente, não se justifica, já que inexiste na capa da publicação qualquer reprodução de ato obsceno, nudez ou pornografia. O conteúdo da obra tampouco infringe as normas vigentes, visto que as famílias homoafetivas são reconhecidas legalmente no Brasil desde 2011, estando alinhadas com as garantias constitucionais do cidadão.”, diz a nota da OAB e do IAB.
Os órgãos ressaltam, também, que não cabe ao Poder Executivo municipal, e, sim, à Justiça da Infância e da Juventude, a ação contra eventuais desrespeitos ao Estatuto da Criança e do Adolescente. “A postura da Prefeitura do Rio, portanto, revela-se como ato de força e censura, que deve ser repelido. Vigilante à efetiva legalidade dos atos das autoridades públicas, a OAB/RJ reafirma seu papel na preservação do Estado democrático de Direito e, caso necessário, recorrerá às medidas cabíveis com vista à defesa da sociedade fluminense”, acrescenta o comunicado, assinado por Luciano Bandeira e Rita Cortez, presidentes da OAB-RJ e do IAB, respectivamente.
A direção da Bienal do Livro do Rio recorreu à Justiça para tentar evitar a apreensão de livros com temática homossexual determinada pelo prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella. Nesta sexta-feira, 6, os responsáveis pelo evento entraram com um pedido de mandado de segurança preventivo no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro para “garantir o pleno funcionamento do evento e o direito dos expositores de comercializar obras literárias sobre as mais diversas temáticas – como prevê a legislação brasileira.”
Em nota, a Bienal frisa manter “sua programação para o fim de semana, dando voz a todos os públicos, sem distinção, como uma democracia deve ser. Este é um festival plural, onde todos são bem-vindos e estão representados.”
Confira, abaixo, a íntegra da nota:
A Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Rio de Janeiro, e o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) vêm manifestar seu repúdio ao ato arbitrário praticado pela Prefeitura do Rio de Janeiro na Bienal do Livro na tarde desta sexta, dia 6. A tentativa de recolhimento da obra em quadrinhos “Vingadores: A cruzada das crianças”, sob o argumento de que violaria o Estatuto da Criança e do Adolescente, não se justifica, já que inexiste na capa da publicação qualquer reprodução de ato obsceno, nudez ou pornografia. O conteúdo da obra tampouco infringe as normas vigentes, visto que as famílias homoafetivas são reconhecidas legalmente no Brasil desde 2011, estando alinhadas com as garantias constitucionais do cidadão.
A OAB/RJ tem em seus pilares a defesa da liberdade de expressão, de pensamento e do pleno exercício da informação, especialmente traduzido na atividade da livre veiculação de livros, revistas, jornais e de todo meio de manifestação escrita legítima, conforme asseguram os direitos e garantias fundamentais esculpidos no artigo 5º, IV, VIII, IX, XIII e XIV, combinado com o artigo 220 e seus parágrafos, da Constituição Federal.
Vale salientar, ainda, que não cabe ao Poder Executivo municipal, e, sim, à Justiça da Infância e da Juventude, a ação contra eventuais desrespeitos ao Estatuto da Criança e do Adolescente.
A postura da Prefeitura do Rio, portanto, revela-se como ato de força e censura, que deve ser repelido. Vigilante à efetiva legalidade dos atos das autoridades públicas, a OAB/RJ reafirma seu papel na preservação do Estado democrático de Direito e, caso necessário, recorrerá às medidas cabíveis com vista à defesa da sociedade fluminense.
Rio de Janeiro, 6 de setembro de 2019
Luciano Bandeira
Presidente da OAB/RJ
Rita Cortez
Presidente nacional do IAB
FONTE: Veja - 06/09/2019