Após intensos debates por duas sessões ordinárias consecutivas, os consócios do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) aprovaram, na sessão desta quarta-feira (4/5), o parecer do relator Guilherme Peña de Moraes, da Comissão de Direito Constitucional. Segundo ele, programas no formato reality show não atentam contra a dignidade da pessoa humana, nem ferem qualquer dispositivo constitucional destinado à garantia de direitos fundamentais. De acordo com a argumentação do relator, "a exibição de reality shows, para aqueles que deles participam, reflete a expressão de suas individualidades e a construção do seu projeto pessoal, manifestando a própria dignidade da pessoa humana em sua concepção contemporânea, longe de significar uma violência a ela".
Guilherme Peña de Moraes inseriu em seu parecer o princípio constitucional que veda qualquer tipo de restrição ou forma de censura aos direitos consagrados à manifestação do pensamento, à criação, à expressão e à informação. O advogado defendeu que "a concepção de dignidade da pessoa humana em uma ordem constitucional pluralista é compatível com diferentes concepções". Segundo ele, "portanto, a redução a uma concepção universal geraria uma tirania da dignidade".
As discussões se iniciaram com a apresentação no plenário, na sessão de 27 de abril, dos pareceres de Guilheme Peña e Emerson Affonso da Costa Moura, da Comissão de Direito Administrativo, que fez a leitura dos dois relatórios, por conta do impedimento do colega de comparecer ao IAB naquela data. Os pareceres foram produzidos a partir da indicação do então diretor acadêmico, Pedro Marcos Barbosa, para que fosse avaliado se programas como Big Brother Brasil, Casa dos Artistas e A Fazenda violariam a intimidade das pessoas, "tendo como norte constitucional a dignidade da pessoa humana".
Dignidade irrenunciável - Em seu relatório, rejeitado pela maioria dos consócios, o advogado Emerson Affonso da Costa Moura defendeu que "a exibição dos programas, embora expressão de suas autonomias, não pode gerar a utilização de um ser humano para diversão alheia, atentando contra a dignidade que não é valor individual, mas compartilhado pela sociedade e protegido pelo Estado". Para o membro da Comissão de Direito Administrativo, "a dignidade é qualidade intrínseca da pessoa humana, irrenunciável e inalienável.
No entendimento do advogado, "há inconstitucionalidade da vinculação de reality shows com conteúdo atentatório à dignidade da pessoa humana em canais abertos". Emerson Affonso da Costa Moura propôs, também, que o IAB encaminhasse sugestão ao Congresso Nacional visando à regulamentação normativa dos programas. No seu parecer, o advogado ressaltou que existe a previsão de restrição constitucional, já que, conforme o artigo 221 da Constituição Federal, "a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão a princípios como o respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família".
Para Guilherme Peña, ao contrário, "a liberdade de expressão, como cláusula geral da liberdade de radiofusão e de programação, abrange a possibilidade de emitir qualquer programa, independentemente do seu conteúdo ou da qualidade, resguardando a sua natureza expressiva e comunicativa". Ao aprovar o parecer de Peña, os consócios acolheram, também, o voto-vista apresentado pelo advogado Francisco Ramalho, igualmente contrário à tese de que há inconstitucionalidades na produção e veiculação de reality shows e ao encaminhamento da questão ao Congresso Nacional.