De acordo com Cesário, os tribunais devem analisar as ações considerando o conceito de público-alvo. “O consumidor, na verdade, é um grupo-alvo das empresas. A gente deve avaliar a concorrência desleal dentro deste grupo de consumidores”, afirmou. Um dos mecanismos que podem contribuir para essa definição, segundo a professora, é a pesquisa de mercado. Ela também esclareceu que, no Brasil, não é possível registrar o chamado trade dress, que se refere ao vestuário que a marca dá ao produto, incluindo cores e design da embalagem. Por esse motivo, as empresas recorrem à Lei 9.279/96, que dispõe sobre os direitos referentes à propriedade industrial. “O que vemos é um número crescente de ações judiciais sobre concorrência desleal, que estão majoritariamente no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), onde estão as maiores empresas e a maior competitividade de negócio”, disse Cesário.
Da esq. para a dir., no alto, Vitor Sardas e Leonardo Sant’Anna; embaixo, Leila Pose Sanches e Ana Amelia Menna Barreto
Na abertura do webinar, a 3ª vice-presidente do IAB, Ana Amelia Menna Barreto, destacou que o evento é uma importante parceria da Escola Superior do Instituto (Esiab) com o departamento de Direito Comercial e do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). A diretora da Esiab, Leila Pose Sanches, endossou que o encontro das instituições tem grande relevância para a Casa de Montezuma: “É uma honra para a nossa escola, que é jovem. Tentamos trilhar os melhores caminhos, com muito esforço e dedicação. Esta Casa valoriza demais a educação e a formação dos nossos alunos”. Pose também agradeceu ao diretor acadêmico da Esiab, Vitor Sardas, pela organização do evento.
Chefe do departamento que co-organizou o encontro, Leonardo Sant’Anna participou da abertura do evento e sublinhou que o debate promovido no IAB é uma importante oportunidade de se divulgar a produção científica da Uerj. “Nós não podemos deixar de ter um celeiro de criação de conhecimento, para poder efetivamente melhorar ainda mais o País e nosso estado”, disse o professor. Também participaram do evento, que terá três dias de duração, o professor da Uerj Enzo Baiocchi e a discente do Programa de Pós-graduação em Direito (PPGD) da Uerj Larissa Rocha, com mediação da coordenadora adjunta e professora do curso de pós-graduação do Ceped/Uerj, Simone Gantois.
Da esq. para a dir., Kone Cesário, Larissa Rocha, Simone Gantois e Enzo Baiocchi
No painel dedicado ao debate dos Temas contemporâneos do Direito da Concorrência, Larissa Rocha defendeu que é preciso fomentar no Brasil o debate antitruste sobre o mercado digital. “Precisamos refletir se os atuais critérios de análise dos direitos antitruste consideram as complexidades dos mercados digitais. O Direito Antitruste pode desconsiderar os fatores de privacidade e proteção de dados em sua análise?”, questionou a palestrante. Ela citou como exemplo o grupo Meta, que controla o Facebook, o Instagram, o WhatsApp e outras redes sociais.
Tratando do papel dos dados pessoais nas plataformas digitais, Rocha pontuou que as big techs têm um modelo de negócios onde as fusões e aquisições de outras empresas são centradas no objetivo de adquirir mais dados para alcançar predominância de mercado. “Todas as nossas experiências e nossos usos das plataformas se constituem em matéria-prima gratuita para as plataformas digitais, para um processamento massivo dos nossos dados pessoais. E, claro, quando falamos de plataformas digitais e serviço gratuito, temos aquela máxima de que se você não paga pelo produto, você é o produto”, afirmou. Segundo a palestrante, há uma insuficiência dos atuais critérios antitruste para o tratamento da questão: “Os dados pessoais, mesmo sendo considerados ativos nessas plataformas digitais, são protegidos pela nossa Constituição Federal como um direito fundamental, pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) e pelo Marco Civil da Internet e devem ser considerado pelo Direito da Concorrência”, concluiu Rocha.
Outro tema atual do Direito da Concorrência, segundo Enzo Baiocchi, é o equilíbrio entre a livre iniciativa e a inovação. Ao analisar a conduta de titulares de patentes, o professor explicou que existem comportamentos anticompetitivos, como os chamados patent trolls e patent hold-up. O primeiro conceito, segundo o palestrante, define “os grupos econômicos ou instituições que têm como único propósito comprar e adquirir portfólio de patentes. Não para utilizar, mas sim para arrecadar royalties”. Dessa forma, essas empresas lucram sem fabricar o produto. “Licenciar essas patentes para arrecadar royalties com elas sempre acaba levando a uma posição de abuso e à cobrança de royalties excessivos”, disse Baiocchi.
Já a patent hold-up representa a patente suspensa. De acordo com o palestrante, ocorre quando o titular de uma patente cria dificuldades de negociação iniciais e leva a outra parte, ou seja, o interessado em acessar essa tecnologia, a usar a patente sem o pagamento. “O que acontece, na verdade, é que essa outra parte acaba sendo processada, se torna réu em um processo de violação de patente, muitas vezes com tutela antecipada, e acaba ficando em uma posição jurídica e negocial fragilizada”, explicou. Baiocchi também pontuou que, a partir do processo, o titular surge com uma proposta mais cara, em uma posição abusiva.