O projeto de lei também regula o funcionamento das empresas ligadas ao mercado digital. No substitutivo do texto foram incorporadas as ideias do projeto de lei 3825/19, apresentado pelo senador Flávio Arns (Podemos/PR). Do ponto de vista do Direito Digital, a comissão que analisou o tema reprovou os termos da proposta. “O projeto é inconstitucional, necessita de drásticas modificações para que se integre ao sistema jurídico brasileiro e tem ainda a necessidade de que certos critérios sejam adicionados a ele para que possa regular a matéria de forma adequada”, disse Marcelo Nogueira, autor do parecer.
A presidente da Comissão de Direito Digital, Fernanda Maibon Sauer, acredita que o projeto “não só não contribui para a melhora do cenário em torno da matéria, como também contribui para uma piora para o lado mais fraco dessa corda, que é o do jurisdicionado”. O parecer da Comissão de Direito Digital critica o fato de os criptoativos serem tratados como “ativos virtuais” pelo PL. “Esse novo nome tem uma definição dentro do projeto de lei que é bastante fluida e que pode, inclusive, gerar confusão sobre a competência dos órgãos para regular as matérias”, afirmou Nogueira.
Outro desvio da proposta, segundo o advogado, é a atribuição de definição da regulamentação ao Poder Executivo. “Poderia-se então, e essa é uma sugestão que colocamos no nosso parecer, estabelecer que o novo órgão que vai fiscalizar e regular a matéria tivesse a competência residual daquilo tudo que não fosse incluído nas competências do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Infelizmente esse não foi o modelo adotado”, disse o relator.
Joaquim Tavares de Paiva Muniz
A regulamentação dos criptoativos, segundo um dos relatores do parecer da Comissão de Direito Empresarial, Joaquim Tavares de Paiva Muniz, é um “dos temas mais palpitantes e urgentes atualmente”. Para ele, o número de investimentos feitos na área impressiona, assim como o número de golpes aplicados no ramo. “O projeto tem o ponto positivo de deixar claro, primeiro, o que são criptoativos e depois delegar aos órgãos regulamentares coordenados entre si”, pontuou Joaquim Muniz. O parecer, que também foi elaborado por Veronica Lagassi e Gustavo Fuscaldo Couri, opina predominantemente a favor do PL 4.401/21, mas propõe o aprimoramento da redação da proposta.
A ressalva dos advogados é sobre a normatização dessa regulamentação. “Sugerimos alguns ajustes pontuais, em termos gerais favoráveis a esse projeto de lei. Nossa principal preocupação é com o artigo 9º, parágrafo único, que dá seis meses para a adequação da norma. A lei provavelmente vai ser sancionada dentro de um governo e regulada dentro de outro”, explicou o parecerista.
Fernando Henrique Cardoso Neves
Na ótica do Direito Penal, o PL 4.401/21, prevê que as empresas adotem boas práticas de governança, evitando crimes como lavagem de dinheiro e estelionato. Para tal, a proposta propõe a alteração das leis que tratam dos crimes do colarinho branco e de lavagem de dinheiro, além do Código Penal. Uma das modificações propõe o aumento da pena quando a lavagem de dinheiro for cometida de maneira reiterada. “Aumento de pena não significa aumento de segurança jurídica”, afirmou o autor do parecer da Comissão de Direito Penal, Fernando Henrique Cardoso Neves.
A alteração na lei do colarinho branco, segundo o relator, é apoiada no que diz respeito "à atualização da legislação frente aos novos tipos de ativos, mas não em relação ao objetivo de combater pirâmides financeiras”. Da mesma forma, o texto rejeita a mudança no Código Penal. “Na redação final foi trazida a crença de que isso vai ser uma resposta adequada para os fenômenos de pirâmide financeira, mas, na realidade, não é”, disse Fernando Henrique Cardoso. Para ele, a matéria de crimes contra a economia popular é devidamente regulamentada do ponto de vista jurídico-penal. “Quando se fala de crimes contra a economia popular, certamente uma reflexão mais profunda do Congresso Nacional vai fazer com que se pensem políticas públicas de educação financeira para identificar esse tipo de fraude, mais do que necessariamente um tipo penal, como o já existente”.
A apreciação do tema é fruto de indicações feitas pela presidente da Comissão de Direito Empresarial, Érica Guerra da Silva, e pelo membro do Instituto João Carlos Castellar. Na visão da indicante, já que o projeto debatido teve sua tramitação encerrada, a ação apropriada seria encaminhar a proposta à Casa Civil, “para a análise de um possível veto e uma melhor discussão sobre o tema”, disse ela. “Não existem mais novos projetos de lei nesta legislatura para regular a matéria”, disse João Carlos Castellar, que acredita que a melhor opção é o veto à proposta.