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Sexta, 27 Outubro 2023 21:11

Adoecimento mental de mulheres tem relação com a sobrecarga no trabalho do cuidado, afirma psicanalista

  Da esq. para a dir., no alto, Rita Cortez, Adriana Brasil Guimarães e Talita Menezes do Nascimento; no meio, Hildete Pereira, Marcus Vinicius Cordeiro e Elaine Molinaro; embaixo, Quezia Tebet, Débora Martins e Daniel Apolônio Gonçalves Vieira Da esq. para a dir., no alto, Rita Cortez, Adriana Brasil Guimarães e Talita Menezes do Nascimento; no meio, Hildete Pereira, Marcus Vinicius Cordeiro e Elaine Molinaro; embaixo, Quezia Tebet, Débora Martins e Daniel Apolônio Gonçalves Vieira

A angústia e a perda de identidade são alguns dos malefícios mentais gerados pela invisibilidade social da mulher que cuida, afirmou a psicanalista, idealizadora e mediadora do coletivo de leituras e vivências femininas Laslobas, Quezia Tebet. Durante o evento Economia do cuidado, desigualdades sociais e aspectos legais, promovido pelo Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) nesta sexta-feira (27/10), Tebet destacou que é comum um ambiente familiar em que a mulher é sobrecarregada com a obrigação de garantir o bem-estar de todos os familiares. “O trabalho dentro de casa é infinito. Quando essa pessoa pode repensar sua vida, se perceber, se cuidar, sonhar e realizar? Temos nisso uma repressão do desejo, que é recalcado, mas sabemos que ele vai sair por algum lugar: o adoecimento”, disse a psicanalista.

O evento, organizado pela Comissão dos Direitos da Mulher, teve abertura realizada pela 2ª vice-presidente do IAB, Adriana Brasil Guimarães, e contou com a participação da professora do Programa de Pós-graduação em Políticas Sociais e do Núcleo de Pesquisas em Gênero da Universidade Federal Fluminense (UFF) Hildete Pereira, dos presidentes das Comissões dos Direitos da Mulher, de Direito do Trabalho, e de Direito Coletivo e Sindical, Rita Cortez, Daniel Apolônio Gonçalves Vieira e Marcus Vinicius Cordeiro, respectivamente, da 2ª vice-presidente da Comissão dos Direitos da Mulher, Débora Martins, da integrante do mesmo grupo Talita Menezes do Nascimento e da diretora da ABA Municipal do Rio de Janeiro, Elaine Molinaro.

Quezia Tebet também afirmou que o suícidio, além de ser mais comum em mulheres do que em homens, é a segunda causa de morte feminina na faixa etária de 15 a 44 anos. “Temos toda essa cultura judaico-cristã da ‘mulher sábia que edifica o lar’, que reforça e sobrecarrega as mulheres em sua maioria. O que nos traz uma perspectiva muito preocupante de adoecimento mental”, avaliou. A psicanalista pontuou que o senso-comum coloca como virtude o amor e a cooperação e faz com que a mulher entre em sofrimento pela necessidade de assumir diversas funções. “Tudo isso também gera muito impacto no âmbito profissional e no acesso da mulher à sociedade. Ela se torna invisível”, completou.

Para Hildete Pereira, falar sobre o papel da mulher no cuidado é discutir o apagamento da importância feminina na reprodução da vida. Homens e mulheres são socializados ainda na primeira infância quanto aos papéis que irão cumprir ao longo da vida: “As menininhas, ainda bebês, são socializadas para cuidar. Basta botar uma boneca na mão de uma menina e uma bola no pé do menino e, aqui, já se selaram os destinos”, disse Pereira. De acordo com a palestrante, todos necessitam de cuidado e, portanto, ele não deveria ser dividido por gênero: “Temos que atuar muito nas escolas e nas creches para mostrar que não tem trabalho de mulher e trabalho de homem. Esse trabalho é de todas as pessoas. As pessoas demandam cuidados e elas vão precisar em todos os momentos da vida”. A professora abordou o tema de forma detalhada no livro Os cuidados no Brasil: mercado de trabalho e percepções, que pode ser baixado gratuitamente aqui.

Se os trabalhos que envolvem a economia do cuidado fossem remunerados, segundo Talita Nascimento, o País teria mais de 600 bilhões de reais por ano contabilizados a mais no Produto Interno Bruto (PIB). “Isso seria mais que 10% do PIB nacional, é mais do que o gasto com a Previdência Social. Esse trabalho não remunerado vale uma fortuna”, destacou a advogada. Abordar a questão é fundamental para conscientizar a população que não entende o valor social dessa atividade, afirmou Elaine Molinaro. “É a única maneira que nós temos de atravessar outras pessoas que não entendem que nós, mulheres, não estamos no lugar de privilégio que os homens originalmente ocupam”, explicou. 

Segundo Rita Cortez, o trabalho invisível da economia do cuidado é o que move o mundo. “Não podemos só olhar a questão pelo aspecto econômico, estamos falando de vida, de pessoas que cuidam das vidas de outros seres humanos”, pontuou a advogada. Adriana Brasil Guimarães ressaltou que os cuidados desenvolvidos no puerpério também fazem parte da atividade em debate. “Foi incluído no rol da economia do cuidado a amamentação, porque foi constatado que as mulheres gastam 650 horas amamentando um bebê. É extremamente importante que o cuidado dado aos filhos seja reconhecido”. Débora Martins também lembrou que os cuidados familiares são atribuídos à mulher de forma inconsciente: “Já se dá uma casinha para uma menina brincar e um carro para um menino. O protocolo de julgamento de gênero tem que ser levado em consideração”, defendeu. 

Daniel Apolônio endossou que a questão deve ser debatida sob a ótica das questões de gênero: “Estamos falando de desigualdade de gênero e da questão da invisibilidade e até desprestígio da função, principalmente do trabalho doméstico não remunerado”. A atividade não remunerada, ressaltou Marcus Vinicius Cordeiro, é invisível e ancestral. “O cuidado tem muito o aspecto da própria existência humana e da família desde a sua origem. A economia do cuidado é talvez o primeiro elemento que esteja presente. Somente era possível haver a caça porque tinha alguém cuidando do futuro daqueles que iriam caçar”, pontuou o presidente da Comissão de Direito Coletivo e Sindical. 


 

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