MURAL DA PRESIDÊNCIA

Discurso de posse

Saudações às autoridades e demais pessoas presentes.

Estimados Consócios, autoridades presentes, Sras. e Srs.

01) Grato pela presença de todos para celebrarmos, juntos, mais uma festa do pensamento  democrático, mais uma comemoração da soberania e da Justiça, elementos que formam a matéria de que é feita esta Casa e nela têm assento, desde a sua longínqua criação pelo abolicionista Francisco Gê Acaiaba Montezuma até os dias atuais. E tenham certeza, vem daí, da sua vocação progressista, da sua inspiração libertária, a reiterada juventude do nosso Instituto.

02) Mas Senhores, quando Paulo Eduardo de Araújo Saboya  me convidou para ocupar o cargo, em sua diretoria, de 1º Vice-Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros, o meu primeiro impulso foi, pela primeira vez, recusar  um convite do amigo. 

Estivemos juntos, eu e Saboya, em diversas campanhas, inclusive quando, contra todos e contra tudo, Paulo Saboya liderou o movimento Ética na Advocacia e candidatou-se à Presidência da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional do Rio de Janeiro.

Aquela manifestação de recusa nem de longe, sabia ele, significava um distanciamento dos nossos ideais e compromissos com a política e com a ética, que, definitivamente, não se resume ao exercício da profissão. Compromissos que temos e tivemos, sempre, na defesa do Estado de Direito Democrático legitimamente constituído, na luta pela redução das desigualdades entre classes e contra todas as espécies de preconceitos e discriminações sociais. Para Paulo Eduardo Araújo Saboya esses compromissos eram autênticos postulados, sem os quais a própria vida perdia o sentido.

A recusa momentânea, manifestada numa manhã nos corredores da Justiça do Trabalho, deveu-se principalmente à responsabilidade que estaria assumindo ao ocupar cargo tão importante. Responsabilidade essa tamanha que, afirmou Paulo Saboya em seu discurso de posse, não pode ser suportada por período maior do que dois anos. 

Aquela recusa momentânea, entretanto, transformou-se logo após, mas não sem antes a prévia aprovação da minha esposa, num sonoro sim, acompanhado por um forte abraço próprio dos amigos. 

03) Um ano depois tenho a honra de ocupar a cadeira de Montezuma, possuído pelo sentimento misto de tristeza, orgulho e alegria. De tristeza porque sentimos, todos nós, a falta do Presidente Paulo Saboya, que nos deixou tão precocemente; de orgulho e alegria porque fomos eleitos pelo voto direto dos sócios do Instituto dos Advogados Brasileiros, que constitui a melhor e maior escola de juristas desse país. Orgulho e alegria não apenas manifestados pelos votos, mas pela qualidade dos apoios declarados, antes das eleições, à nossa candidatura, o que nos fez pensar um dia "se Deus é conosco, quem estará contra nós".  

Reafirmo: fomos eleitos, utilizando a primeira pessoa do plural não por mera modéstia, mas na certeza que a minha eleição representa, também, a aprovação de um trabalho grandioso que vem sendo executado por todos que ocupam a diretoria do Instituto e que foram igualmente eleitos com Paulo Saboya.


04) A história do Instituto dos Advogados Brasileiros senhores é a história do Brasil escrita em letras jurídicas.

O IAB não tem idade, tem história. Não a história que a ironia refinada de Aléxis de Tocqueville definiu como uma galeria de quadros de poucos originais e muitas cópias. Pois aqui temos um rosário de originais. Homens públicos de estirpe, notabilizados por suas posições firmes e decididas em favor dos melhores valores de uma sociedade igualitária e fundada no Estado de Direito como foram, entre outros, Ruy Barbosa, Sobral Pinto, Miguel Seabra Fagundes,  Haddock Lobo....assim como foi o meu querido companheiro dos bons combates Paulo Eduardo de Araujo Saboya. Advogados, sobretudo, e que em razão disto ganharam a notoriedade que os inscreveu na coleção dos inéditos.

Difícil, portanto, não cairmos na tentação saudosista diante da riqueza que o passado do IAB encerra. Mas o que seria de tudo isso, de todos esses gloriosos momentos idos e vividos - com a licença de Machado -, se não tivéssemos o presente para reconhecê-los e o futuro para propagá-los? Indagação cuja resposta conduz ao propósito de nossa eleição.

De fato. Os feitos de nossa entidade, amparados nos princípios inscritos na letra fria dos estatutos, anseiam por serem revividos, desejam ressonância junto àqueles para quem a difusão de conhecimentos jurídicos e do culto à Justiça deve necessariamente estar amalgamada com a defesa do estado democrático de direito e dos direitos humanos, com a promoção da igualdade racial e do meio ambiente. Afinal, não se admite que sejamos apenas uma casa de pensamento diletante, de interpretações filosóficas diversas sobre o mundo. Devemos também agir, buscar as mudanças que permitam a realização de nossos ideais. 

O Instituto dos Advogados Brasileiros não é um mero espectador dos fatos históricos e relevantes verificados nos últimos 165 anos. Antes pelo contrário, é um agente transformador que, se durante a sua longa existência nem sempre viu a história pela ótica dos oprimidos,  teve participação ativa, com a atuação destacada dos seus membros, na luta pela abolição da escravatura;  na separação do Estado e da Igreja com a constitutição do estado laico; na redemocratização do país no período Vargas e no ainda recente período do regime militar.O Instituto cerrou fileiras ao lado daqueles que apoiaram o movimento pela anistia e o conhecido movimento das "Diretas Já". 

E atualmente o Instituto é o palco de debates sobre questões jurídicas relevantes, tais como, entre outros, a demarcação da reserva indígina Raposa Serra do Sol, a vigência da Convenção 158 da OIT no cenário juridico nacional, conforme preleciona o Min. e consócio Arnaldo Sussekind, a distribuição dos royates da Petrobrás, a reforma tributária e política.   

04)    Afirmei anteriormente que a minha eleição representou também, em pleno exercício do mandato, a aprovação da gestão iniciada pela atual diretoria. Assim, seria incoerente de minha parte afirmar que os projetos que tenho não são aqueles anunciados por Paulo Saboya em seu discurso de posse e que se  encontra publicado no site oficial do Instituto. Não só os projetos,  mas as apreensões e angústias externadas pelo Presidente naquela ocasião.     

05)    Também estou entre aqueles que concorda que o Brasil é um país de dimensões continentais. Em seu extenso território agasalha culturas, costumes e tradições diferentes. Compõe-se de realidades sociais diversas, que são, entretanto, disciplinadas por um sistema nacional de códigos e leis divorciado dessas realidades regionais, códigos e leis, que, se não servem de instrumento para agravar essas desigualdades, acabam por manter e cristalizar o status quo, eternizando desigualdades, diferenças e dessemelhanças. 

É necessário estudar e debater se um país com tamanhas diferenças deve ter codificado todo o seu direito nacional; se deve ser atribuída à União, assim como se verifica atualmente, a competência para legislar praticamente sobre todos os temas e questões relevantes.

É preciso desonerar a força de trabalho de impostos, contribuições e tributos. Pesquisa recente publicada pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário indica que o brasileiro trabalhará 147 dias em 2009 apenas para pagamento de impostos, ou seja, quase metade do valor de um ano de trabalho será transformada em impostos. Tamanha carga tributária é perversa e definitivamente não é útil para diminuir as desigualdades sociais.  Certamente, um dos fatores determinantes que levam a aproximadamente 45% das pessoas em idade economicamente ativa ao mercado informal de trabalho, sem anotação da carteira profissional, está na carga tributária que incide sobre o valor da força de trabalho.

A reforma política está na Ordem do Dia do Instituto, que não será um mero espectador do projeto de lei encaminhado ao Congresso Nacional. É dever do Instituto - e tenham certeza que não fugiremos dele - analisar, debater, criticar e, se necessário - e me parece que será -, apresentar alterações ao projeto de lei, sempre com a finalidade de aumentar a participação e a vontade popular na elaboração de leis, formação do parlamento e eleição dos seus representantes para o executivo. 

06) Assumi o exercício da Presidência do Instituto dos Advogados Brasileiros em fevereiro desse ano, com o comunicado do falecimento de Paulo Saboya. 

Nesse curto espaço de tempo implementamos alguns compromissos e  projetos anteriormente assumidos.

Assim, ampliamos o espaço físico do Instituto, resgatando com o auxílio e apoio da atual direção da CAARJ o 6º andar deste prédio, onde se encontra o plenário histórico que já abrigou o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Neste mesmo 6º andar, sem prescindir do apoio do Conselho Federal, destinaremos um gabinete para receber, no Rio de Janeiro, o Presidente Federal da Ordem dos Advogados. Dessa forma, estaremos também inserindo o Rio de Janeiro, outra vez, no cenário político-jurídico nacional com condições de receber e promover sessões do Conselho Federal e aprofundando o nosso relacionamento com a Ordem.

Promovemos, também, diversos eventos, que não poderiam ter sido realizados sem o inestimável trabalho das Comissões e do nosso Centro Cultural, com destaque para a palestra sobre o Processo Eletrônico na Justiça Federal, Drogas na Sociedade sob a Perspectiva do filme "Meu nome não é Johnny". Promovemos também a apresentação do anteprojeto de lei sobre a Concessão de Honorários de Sucumbência na Justiça do Trabalho, de autoria de Arnaldo Sussekind e Benedito Calheiros Bomfim, como resultado de trabalho elaborado  pela comissão de estudo formada pela Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro. Não menos importante foi a palestra proferida pelo professor norte-americano Thomas Morgan sobre Direito Antitruste e Advocacia.

Recentemente, no último dia 22 de maio, o Instituto dos Advogados Brasileiros assinou acordo de cooperação técnica com Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT e Escola da Advocacia-Geral da União-EAGU no 2º Seminário Regional da Advocacia Pública Federal realizado no Plenário Evandro Lins e Silva da OAB/RJ.
 
Vejo nesse acordo a execução de autêntico projeto de inclusão social, uma vez que possibilitará a informatização da Biblioteca do Instituto, o seu maior patrimônio, que conta hoje com um acervo composto por mais de 36.000 volumes abordando os mais variados temas de direito. Com a implementação do projeto, todos os estudantes, inclusive aqueles de nível médio, pesquisadores e operadores de direito, carentes ou não, localizados nas regiões mais distantes desse país, terão acesso à biblioteca do instituto por meio da Internet. E assim, trazendo nosso acervo à luz, o IAB contribui para a elevação dos conhecimentos não só da categoria, mas do cidadão comum, independente de sua corporação. Repita-se, um autêntico processo de inclusão social, contando com a qualificada participação do IAB.

Nessse sentido, creio que a modernização dos canais de relacionamento do IAB será - como, aliás, já se vem demonstrando - a tarefa fundamental para as transformações pretendidas. A transmissão de educação, cultura e conhecimento não só aos advogados, mas também a estudantes e a todos aqueles brasileiros desejosos de conhecerem nosso trabalho, será o leitmotiv da administração ora empossada, força motriz de qualquer renovação que pretendemos para a nossa entidade. E para tanto, o novo site do IAB e a Revista Digital figuram na ponta-de-lança dos mecanismos de que necessitamos, servindo dialeticamente para a transmissão de conhecimentos, cultura e educação, e processando, como retorno interativo daqueles a quem se destina, informações que permitem uma maior compreensão da realidade social brasileira. 

07)    Mas para não se dizer que só se falou de flores, é inegável que ao IAB cabe também preocupações que afetam a vida pública, suas instituições, a Nação enfim. Irmanado com a nossa entidade representativa, a Ordem dos Advogados do Brasil, o Instituto vem participando de todos os eventos que dizem respeito à defesa da cidadania e do estado democrático. Foi assim que compreendemos nossa recente presença em Brasília, na marcha contra a já alcunhada PEC do Calote, medida destinada a impedir que o estado cumpra suas obrigações decorrentes de decisões judiciais, criando-se assim uma nova categoria de devedores, com regalias especiais defesas ao homem do povo. 

Estivemos e estaremos firmes, contribuindo com nossos conhecimentos e capacidade de mobilização. Seja para cuidar do aperfeiçoamento jurídico, seja para defender a soberania de nossas florestas, o patrimônio nacional, as empresas que produzem a riqueza da Nação e que não saem da mira dos eternos mascates do país. 

Fica, portanto, o registro de que em episódios tais, de maior ou menor envergadura, mas todavia perpassados pelos interesses populares, pela defesa dos valores materiais e imateriais que construímos no nosso Brasil ao custo alto das vidas sumidas ou abreviadas, das manchas torturadas que não se apagam, o IAB estará sempre presente e alinhado com os demais democratas e patriotas desse país. É a nossa vocação, já experimentada antes em tantos outros momentos da história, e que encontrará nesta gestão preocupação especial de igual relevância com que serão tratadas
as questões meramente corporativas e acadêmicas.

Somos advogados, e não porque haja gente ruim, como sustenta a pilhéria do grande escritor Charles Dickens. Somos porque contribuímos para a construção de uma sociedade mais justa, cuja existência somente poderá ser atestada pela nossa presença atuante, independente. E este Instituto continuará a ser, portanto, a Casa de afirmação cotidiana de nossos históricos compromissos.

08) Finalmente, não posso deixar de agradecer à minha diretoria. 

Agradecer pelo trabalho incansável e pelo permanente companheirismo que não me têm deixado jamais sentir a solidão da Presidência.

Agradecer a Nelson Paiva Paes Leme, Adherbal Augusto Meira Mattos, Gloria Marcia Percinoto, Rodrigo Lins e Silva Candido de Oliveira, Ester Kosovski, Kátia Rubinstein Tavares, Luiz Dilermando de Castello Cruz, Maria Teresa de Almeida R. Cárcomo Lobo, Ana Amelia Menna Barreto de Castro Ferreira, Humberto Jansen Machado, Fernando Fragoso, Augusto Haddock Lobo, Claudete Silva de Araújo Barata e Sydney Limeira Sanches.

Agradecer aos funcionários do Instituto, esses 10 espartanos que se desdobram diária e pacientemente na execução de múltiplas tarefas, operando verdadeiros milagres com os parcos recursos da instituição. Aqui, tenham certeza, cada centavo é contado.

Agradecer a Benedito Calheiros Bomfim, porque pelas mãos de Bomfim eu ingressei no Instituto.

Não posso deixar de lembrar de meu falecido pai e da minha mãe, hoje ausente por motivo de saúde, que foram os principais responsáveis pela minha formação.

Agradeço aos meus sócios e funcionários que me apoiaram plenamente nessa nova empreitada.

E um agradecimento especial aos meus filhos Pedro Henrique e Anna Carolina e a minha esposa Newma, a quem eu peço sinceras desculpas pelas incontáveis horas de ausência. Pelos finais de semana que passei debruçado sobre livros e processos, pelas reuniões intermináveis que me tiraram do convívio de vocês.
    
Mas tenham certeza que tudo que foi feito e o pouco que foi feito, foi por vocês também.

Obrigado 
Henrique Cláudio Maués
Presidente do IAB 

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