Temos acompanhado ao longo dos anos recentes reiterados ataques às nossas instituições democráticas, que se intensificaram, especialmente, nos últimos meses e tendem a aumentar com a proximidade das eleições. São provocações dos núcleos aprisionados no passado autoritário, que tentam desautorizar o Tribunal Superior Eleitoral, o Supremo Tribunal Federal e seus ilustres integrantes perante a sociedade. Na mesma trilha, as ações desses mesmos grupos contra a imprensa e o fomento à desinformação visam a agravar a intolerância social e alimentar o discurso de ódio, com o propósito de legitimar teses inverossímeis e contrárias aos interesses republicanos.
É verdade que as ações havidas nos últimos anos para fragilizar o Estado brasileiro foram concretas e presenciamos exemplos no meio ambiente, cultura, educação, direitos humanos e economia que desmantelaram estruturalmente o país, e a sua recomposição demandará anos de muito trabalho.
Essa prática destrutiva e diuturna de integrantes do Poder Executivo, alimentada pelo próprio presidente, tem provocado reações e manifestações críticas das entidades que defendem a democracia e da imprensa. Mas, por outro lado, tem, curiosamente, revelado a pouca articulação conjunta e organizada para criação de uma frente ampla, sólida, apartidária e comprometida com as conquistas democráticas.
Como afirma o ex-deputado constituinte Miro Teixeira, não se trataria de uma união para defender a democracia, pois sobre isso não se transige, mas de uma frente para rearrumar nossa República e tornar publicamente firme o compromisso com o Estado Democrático de Direito. Ainda segundo Miro, manifestos em defesa da democracia — que estaria supostamente em risco — serviriam para demonstrar “fraqueza”, alimentando o discurso de crise e de ruptura institucional. Assiste razão ao ex-parlamentar. Não devemos nos apequenar!
Mas para que a frente seja efetiva, em especial nesta quadra histórica, é papel das entidades da sociedade civil que defendem a democracia (IAB, OAB, ABI etc.), em conjunto com as instituições democráticas, poderes constituídos e setor produtivo, aliados aos organismos de proteção à liberdade de imprensa, assumirem o protagonismo coletivo e evitarem a conveniente prevalência do discurso autoritário, que prefere grassar no mote da “crise da democracia” para dividir e tornar tíbia nossa democracia.
O bicentenário de nossa Independência, que simbolicamente representa o ato inaugural de nossa trajetória identitária, soberana e de lutas pelas liberdades nacionais, nos compele a repelir qualquer retrocesso. Precisamos preservar o processo eleitoral, o funcionamento de nossas instituições e a atuação de uma imprensa independente, pois são os meios que permitirão assegurar a higidez de nossos compromissos constitucionais insculpidos na Carta Política.
Urge a união das entidades que compõem as forças civis democráticas, a fim de rechaçar as ameaças e bravatas golpistas, que visam a desestabilizar as conquistas sociais e constitucionais das últimas décadas. O momento é de rearrumar a República brasileira e primarmos pela valorização da solidez de nossa democracia, jamais dela duvidar. Ainda que soe antigo ou fora de época, é chegada a hora de bradarmos aos oportunistas do atraso “ditatura nunca mais”!
*Sydney Sanches é presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)
FONTE: O GLOBO