O Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) é a favor descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. A posição foi firmada na sessão ordinária desta quarta-feira (25/7), com a aprovação do parecer da relatora Kátia Rubinstein Tavares, da Comissão de Direito Penal, que acolheu os fundamentos contidos na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol) no Supremo Tribunal Federal (STF). O partido pede que o STF declare inconstitucionais os artigos 124 e 126 do Código Penal, que criminalizam a prática do aborto. "Os dois dispositivos violam princípios constitucionais, como o da dignidade da pessoa humana, e os direitos fundamentais das mulheres à vida, à liberdade, à saúde e ao planejamento familiar", afirmou Kátia Tavares.
A presidente nacional do IAB, Rita Cortez, encaminhará o parecer à relatora da ADPF 442, ministra Rosa Weber, e aos demais ministros da Corte Suprema. Além disso, o Instituto enviará representante à audiência pública que o STF promoverá, nos dias 3 e 6 de agosto, com o objetivo de instruir o processo de julgamento. Participarão dos debates advogados, defensores públicos, médicos, psicólogos, acadêmicos, líderes religiosos e membros de organizações não governamentais, que opinarão sobre a proposta de exclusão da incidência dos artigos 124 (aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento) e 126 (aborto provocado por terceiro). Ambos foram inseridos no Código Penal que entrou em vigor em 1940.
Âmbito jurídico – "As duas únicas hipóteses de interrupção da gravidez não consideradas ilicitudes são aquelas em que, conforme a legislação em vigor, o aborto é necessário para salvar a vida da gestante ou quando a gravidez resultou de estupro", lembrou Kátia Tavares. Para a advogada, "o debate sobre a questão do aborto deve se dar no âmbito jurídico, levando-se em conta os dados científicos relevantes que apontam para injustiça da sua criminalização à luz da ordem constitucional vigente e de instrumentos internacionais de direitos humanos".
Na defesa da descriminalização, a relatora informou que o aborto até a 12ª semana de gestação é admitido em diversos países europeus, como Alemanha, Áustria, Bulgária, França, Bélgica, Bulgária, Dinamarca, Espanha, Filândia e Hungria, e em alguns da América Latina, como Cuba, Uruguai e Guiana Francesa. "Na Suécia, a interrupção da gravidez é permitida até a 16ª semana", acrescentou.
Para Kátia Tavares, o aborto é um problema de saúde pública, que não pode ser tratado como caso de polícia. "O procedimento de interrupção da gravidez ocorre, para a maioria das mulheres brasileiras, em condições insalubres. São jovens, negras e indígenas, pobres e pouco escolarizadas", disse. Ainda de acordo com a advogada, "impõe-se no Brasil uma brutal diferença aos cidadãos de poder aquisitivo, pois a mulher rica tem condição de pagar pelo aborto com segurança, higiene e cuidados, enquanto a mulher pobre e desesperada com a gravidez o faz em condições precárias, sob o risco de hemorragias graves que, em muitos casos, podem levá-la à morte".
Avanços – A advogada destacou decisões do STF que, nos últimos 10 anos, promoveram avanços no tratamento da questão. A primeira delas ocorreu em 2008, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.510, quando foi autorizada a realização de pesquisas com células-tronco embrionárias. "Em 2012, ao julgar a ADPF 54, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde, o Supremo garantiu às gestantes de fetos anencefálicos o direito à interrupção da gestação, sem a necessidade de autorização judicial ou qualquer outra forma de permissão específica do Estado", relatou.
Segundo Kátia Tavares, a decisão não foi tomada somente em respeito aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da intimidade e do direito à saúde e à proteção da maternidade. "A decisão do Supremo teve como fundamento, também, a liberdade de crença, diante do fato de o Brasil se constituir em um Estado laico, cuja estrutura político-jurídica deve se apresentar neutra em relação a dogmas religiosos", disse.
Na sua argumentação sobre o histórico de julgamentos no Supremo relacionados ao tema, a relatora também citou ainda o habeas corpus 124.306, concedido, em 2016, pela Primeira Turma, seguindo o voto-vista do ministro Luís Roberto Barroso. "Foi concedida a liberdade aos funcionários de uma clínica clandestina no Rio de Janeiro presos preventivamente pela prática de aborto", informou. De acordo com a advogada, "o STF concluiu pela inconstitucionalidade dos dispositivos do Código Penal nos casos de interrupção voluntária da gestação no primeiro trimestre, por considerá-los uma violação dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres".
FONTE: Paraíba - 27/7/2018