Em seu parecer, Luiz Paulo Vieira de Carvalho analisou a legalidade e a pertinência do posicionamento do STF, que sofreu críticas, em razão de ter ocorrido o reconhecimento judicial das chamadas famílias dúplices ou paralelas em algumas decisões judiciais, embora minoritariamente. “O STF não quis, ao contrário da versão simplista de alguns que criticaram a sua decisão, substituir o Congresso Nacional, mas sim, cumprir o seu dever, ao aplicar o Direito posto da maneira correta, técnica e sistemática, na qualidade de órgão maior garantidor da Constituição Federal”, defendeu o advogado.
De acordo com Luiz Paulo Vieira de Carvalho, a decisão do STF, tomada em dezembro de 2020 no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1.045.273/2019, foi posteriormente ratificada na corte pelo RE 883.168/2021 e pelo Agravo de Instrumento (AI) 609002/2021. No caso concreto, explicou o advogado, o primeiro recurso extraordinário foi interposto pelo alegado companheiro de um falecido contra decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE), que considerou tratar-se de uma relação afetiva paralela.
“Embora tenha reconhecido a existência da união homoafetiva, o tribunal negou o direito à metade da pensão por morte, por considerar a impossibilidade jurídica de dupla união estável, com base no princípio da monogamia no ordenamento jurídico-constitucional brasileiro, que não admite a existência simultânea de mais de uma entidade familiar, independentemente da orientação sexual das partes”, disse o advogado. Ele acrescentou ainda que “a decisão do STF endossa a posição jurisprudencial presentemente consolidada no âmbito do STJ, segundo a qual não é possível o reconhecimento de uniões estáveis simultâneas”.
Bigamia – Luiz Paulo Vieira de Carvalho reproduziu trecho do voto do Ministro Alexandre de Moraes, relator do Recurso Extraordinário 1.045.273/2019, para quem “o fato de haver uma declaração judicial definitiva de união estável impede o reconhecimento, pelo Estado, de outra união concomitante e paralela.” O advogado ressaltou ainda que o ministro observou que o STF, ao reconhecer a validade jurídico-constitucional do casamento civil ou da união estável por pessoas do mesmo sexo, “não chancelou a possibilidade da bigamia, mas sim conferiu plena igualdade às relações, independentemente da orientação sexual”.
O presidente da Comissão de Direito de Família e Sucessões do IAB embasou os efeitos do entendimento da Suprema Corte: “Conforme a decisão, quem vive uma relação afetiva paralela continuada com alguém, do mesmo sexo ou de sexo diferente, sabendo que a pessoa está inserida em família regularmente formada aos olhos do ordenamento posto, sem que tenha sido rompido o vínculo primitivo, atua com livre arbítrio, mas plenamente ciente que não está convivendo numa família reconhecida pelo Direito”.
Luiz Paulo Vieira de Carvalho também comentou os aspectos penais que envolvem a questão e que foram ressaltados pelo ministro do STF em seu voto. “Foi destacado que o Código Civil, em seu artigo 1.723, impede a concretização de união estável com pessoa já casada, sob pena de se configurar a bigamia, tipificada como crime no artigo 235 do Código Penal”, assinalou. Em relação ao aspecto previdenciário, o advogado disse que “a legislação só admite como destinatário da pensão post mortem o cônjuge e o companheiro, e não o concubino”.
Ele, porém, ressaltou que a decisão do STF não impede que o STJ e outros tribunais reconheçam a chamada união estável putativa, assim como os direitos dela decorrentes. “Essa forma de união se configura quando a concubina ou o concubino consegue provar, de modo inequívoco e irrefutável, que estava de boa-fé, isto é, que não tinha conhecimento de que vivia em concubinato, acreditando ser uma relação monogâmica, entendendo assim, subjetivamente, que vivia em união estável”, explicou.