O webinar também teve a participação dos professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Alexandre Assumpção, Ricardo Mafra e Leonardo Sant’Anna, da professora da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj) Thalita Almeida, da professora da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV/SP) Mariana Martins Costa Ferreira, do pesquisador e do professor do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual Heleno Bezerra Neto e Carlos Maurício Ardissone e do membro do IAB Luiz Cesar Loques. As mesas de trabalho foram mediadas pelo discente do Programa de Pós-graduação em Direito (PPGD) da Uerj Rômulo Villa Verde e da advogada da American Chamber of Commerce Zora Motta Fayal de Lyra.
Trazendo uma perspectiva histórica sobre o Direito Falimentar, Thalita Almeida afirmou que a legislação que trata sobre o tema no Brasil começou muito agressiva e ganhou perspectivas diferentes ao longo do tempo. O Código Comercial de 1850, destacou a palestrante, determinava que os falidos eram proibidos de comerciar. A reabilitação deles também tinha limites: “A possibilidade de reabilitação tinha uma conexão com a qualificação da decretação da falência. Ela poderia ser considerada qualificada, casual, culposa ou fraudulenta. Se aquele falido tivesse a decretação da sua quebra considerada fraudulenta, ele não poderia mais se reabilitar, essa era a consequência”, explicou.
É no âmbito da falência fraudulenta que a legislação mais avançou durante o Estado Novo, sublinhou Alessandro Assumpção. Apesar de outras mudanças legais terem sido aprovadas até então, apenas em 1945, através do Decreto-Lei 7.661, o Estado passou a oferecer melhores condições para que o falido retomasse suas atividades, afirmou o professor. “A expressão falência fraudulenta foi substituída por crime falimentar, com pena de reclusão. Se o falido fosse condenado, ele poderia se reabilitar por pagamento parcial e essa é a grande inovação. De 1890 a 1945, a falência fraudulenta era passível de reabilitação pelo pagamento integral ou na hipótese eventual de uma quitação plena, que era muito difícil”, completou Assumpção.
Da esq. para a dir., Ricardo Mafra, Zora Motta Fayal de Lyra, Mariana Martins Costa Ferreira e Luiz Cesar Loques
Informações no mercado de capitais – No debate a respeito da Responsabilidade da companhia sobre as informações divulgadas ao mercado, Ricardo Mafra lembrou que não são apenas as empresas que devem fazer pronunciamentos sobre fatos relevantes: “Essa responsabilidade recai sobre duas pessoas diferentes, o diretor e a companhia”. De acordo com o professor, “o ato do diretor, quando é um ato regular, é imposto à própria companhia. Ele, quando assina o fato relevante, está divulgando em nome próprio e está divulgando também como órgão da companhia”. A pessoa jurídica, lembrou Mariana Ferreira, só vai conseguir dar cumprimento a regras e obrigações se ela tiver os membros dos seus órgãos sociais cumprindo seus próprios deveres. “Eles foram criados e pensados especificamente para que aquela pessoa jurídica possa cumprir com as suas obrigações e com o seu papel dentro das suas limitações de atividade e interesse social”, afirmou.
Luiz Cesar Loques ressaltou que as responsabilizações voltadas à pessoa jurídica não são novidade no ordenamento jurídico. No entanto, o advogado destacou que o projeto de lei 2.925/23, que altera a legislação do mercado de capitais para proteger acionistas minoritários contra prejuízos causados por administradores de companhias abertas, cria um ambiente de incentivo de private enforcement, que é realizado a partir da indenização das vítimas afetadas pela prática de condutas restritivas à concorrência. “O objetivo do legislador é ampliar essa figura no nosso Direito Societário. Isso não é exatamente uma novidade, mas o que me parece é que existem alguns institutos processuais que o projeto incentiva para que esses agentes da companhia possam ir em cima daquele que causou o dano por falha informacional. Geralmente, o administrador’, explicou o palestrante.
Da esq. para a dir., Carlos Maurício Ardissone, Rômulo Villa Verde, Heleno Bezerra Neto e Leonardo Sant’Anna
ADI 5.529 – O Brasil está entre os cinco países com maior demora na apreciação dos pedidos de patente, afirmou Leonardo Sant’Anna, que apresentou, no quarto painel do evento, um panorama da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5529 julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O objetivo do pedido era questionar o artigo 40 da Lei 9.279/1996 (Lei da Propriedade Industrial – LPI), que previa que o prazo de vigência da patente não seria inferior a 10 anos para patentes de invenção e sete anos para modelo de utilidade, contados a partir da concessão. “Na prática, tal situação gerava uma série de controvérsias porque, indiretamente, causava uma ampliação desse prazo de vigência por conta da demora administrativa”, explicou o palestrante.
O julgamento foi acelerado pela crise sanitária causada pela pandemia de Covid-19. “Esse dispositivo passou a ter um impacto maior nas questões do direito fundamental à saúde. Enquanto não houvesse a superação da patente, os grandes laboratórios teriam o monopólio pelos seus investimentos feitos”, afirmou Sant’Anna. Ele ainda destacou que estudos da época apontavam que os cofres públicos sofreriam prejuízos de mais de R$ 1 bilhão por ano pela compra de medicamentos cujos prazos de vigência foram estendidos por conta da existência dessa regra. Nesse contexto, como lembrou o advogado, oito dos 11 ministros concordaram que a regra é considerada inconstitucional já que “o dispositivo tornava o prazo de vigência das patentes indeterminado, não sendo possível saber o prazo final da vigência de uma patente até o momento em que essa é concedida, o que pode demorar mais de uma década”.
Carlos Maurício Ardissone endossou que a pandemia foi a responsável por sensibilizar a Suprema Corte sobre a necessidade de fazer o julgamento e pontuou que o STF entendeu a necessidade de resguardar os interesses da coletividade. Por outro lado, de acordo com Heleno Bezerra, a discussão sobre o artigo acabou centrada apenas na área de fármacos. “A questão ficou fundamentada, mas depois começa o primeiro problema da decisão do Supremo: ele fala que o efeito ex tunc será para as patentes farmacêuticas e de equipamentos médicos. O que é patente farmacêutica e o que é patente de equipamento médico? A linguagem que o Supremo usa não foi muito clara, então ficou uma obscuridade na decisão”, pontuou Bezerra.
Outra importante consequência do julgamento, lembrou Carlos Maurício Ardissone, acabou sendo o posterior envolvimento do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) na matéria. “A partir do que aconteceu nesse julgamento, o INPI resolveu também tomar iniciativa de apresentar projetos de mudança na lei”, afirmou. Na visão do palestrante, a palavra chave para o enfrentamento do tema é a calibragem: “A propriedade intelectual não é negativa ou positiva per si. Tudo depende de uma constante calibragem, de articulação de políticas públicas e de trazer também o setor privado para discussão, para procurar um projeto que seja adequado à cláusula finalística que está esculpida na Constituição”.