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Quinta, 15 Dezembro 2022 21:09

No IAB, palestrante diz que a norma jurídica brasileira não acompanha a urgência social

Leila Bittencourt Leila Bittencourt

Para a membro da Comissão de Filosofia do Direito do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) Leila Bittencourt, “a norma jurídica é atrasada em relação à urgência social”. Durante a palestra intitulada A importância do problema metodológico da realização do Direito e da Filosofia do Direito da Pós-Modernidade, realizada pelo IAB nesta quinta-feira (15/12), a advogada apresentou a ideia de que o Direito, diferente da arte, por exemplo, não consegue refletir o imediatismo social. “O Código Civil não abarcou algumas relações, principalmente no que diz respeito à Era Digital, mas, no todo, ele é fantástico”, exemplificou Bittencourt. 

O debate foi promovido, como lembrou a presidente da Comissão de Filosofia do Direito, Maria Lucia Gyrão, que conduziu a discussão, dentro do ciclo de palestras do Bicentenário da Independência. “Finalizamos hoje o temário que começou no início deste semestre e veio a demonstrar o pensamento filosófico-jurídico do Brasil independente”. Durante a abertura da mesa, a 3ª vice-presidente do IAB, Ana Amelia Menna Barreto de Castro Ferreira, ressaltou a atuação operosa da comissão organizadora. Também participaram da discussão, o presidente da Comissão de Direito Internacional, Luiz Dilermando de Castello Cruz, o vice-presidente da Comissão de Filosofia do Direito, Francisco Amaral, e a membro da mesma comissão Valéria Tavares de Sant’Anna.

 

Da esq. para a dir., acima Valéria Sant’Anna, Maria Lucia Gyrão e Dilermando Cruz; embaixo Ana Amelia Menna Barreto e Francisco Amaral

Durante o painel A Filosofia do Direito da Pós-Modernidade, Leila Bittencourt afirmou que “o conhecimento científico é sempre provisório, sempre sujeito a ser retificado e não ratificado”. Nesse sentido, o Direito da pós-modernidade, segundo a advogada, não é marcado pela garantia de estabilidade. “Todo processo cultural acaba por gerar um processo de reavaliação e revalorização. O pós-moderno trouxe para o Direito a possibilidade do diálogo entre diversas teorias, culturas e valores: a primordial, a questão da justiça, não é mais a busca das instituições justas, mas como é que a justiça poderia ser promovida nas instituições que estão postas”. 

A fluidez do mundo pós-moderno, explicou Bittencourt, “afeta o Direito e exige uma readaptação ao momento”. Todavia, a advogada acredita que “a nossa legislação é atrasada em algum sentido, já que não dá conta da urgência social desse mundo que caminha tão fantasticamente rápido”. No mesmo sentido, argumentou Valéria Sant’Anna, a tecnologia tem sido a verificadora que caracteriza o momento do processo civilizatório em que a sociedade está. “A tecnologia ter sido trazida sem nenhum planejamento, de forma quase sacra, fez com que não tivéssemos condições de nos adaptar a ela”, disse. 

Sem essa adaptação, “ao invés de catapultar o processo civilizatório, a tecnologia da informação parece, em vários aspectos, atrasá-lo”. Nesse contexto, a advogada apresentou a Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), que preconiza 17 objetivos para o desenvolvimento sustentável do planeta. “Ela foi lançada no início deste século e, 10 anos depois, foi se verificar, através de medidores, que alguns objetivos não só estavam muito longe de serem alcançados, como estavam em condições piores do que quando o século começou”, explicou Valéria Sant’Anna. 

Um dos exemplos usados pela advogada foi a relação do indivíduo com a notícia, já que a atuação do jornalista, atualmente, compete com a facilidade de compartilhamento de informações nas redes sociais. “Paula Veiga dizia que, se o método que o jornalista utiliza para construir seu trabalho é desnecessário e qualquer um pode fazer, isso abre margem para que qualquer outra atividade, igualmente, seja feita por qualquer um”, citou Sant’Anna. Ela afirma que, se a preocupação com o fundamento for tirada da informação, a possibilidade de debate é excluída. 

Hermenêutica -– Dilermando Cruz e Francisco Amaral apresentaram o painel O problema metodológico da Realização do Direito. A interpretação jurídica. O Jurisprudencialismo, que deu abertura à discussão sobre a importância da hermenêutica como prática científica e jurídica. Segundo Dilermando Cruz, “na técnica jurídica, o círculo hermenêutico funciona para referir signos que consistem nos sentidos dos antecedentes e dos consequentes das regras jurídicas”. O jurista explicou que, psicologicamente, o processo de compreensão tem em seu início uma conjectura de sentido: “Mesmo na investigação científica, a compreensão do dado pressupõe uma antecipação do seu sentido”. 

O palestrante afirmou, ainda, que as regras de interpretação, que disciplinam a atribuição de sentido ao resultado do funcionamento das fontes do Direito sempre fazem parte da ordem jurídica. “É com base na informação científica, própria ao seu ofício, que o jurista identifica e seleciona as regras jurídicas possivelmente incidentes para resolver cada conflito de interesses que lhe é apresentado ou que ele mesmo imagina que exige interpretação”, afirmou Dilermando Cruz.

Na palestra apresentada por Francisco Amaral, o debatedor abordou a metodologia da realização do Direito e a decisão justa do caso concreto. Por metodologia, o jurista entende que "não é só o conjunto de procedimentos metódicos de uma ciência, mas também a análise filosófica de tais procedimentos”. Ele acredita que a atividade do advogado é, em si, a retórica de convencer a pessoa que decide sobre o tema. Dessa forma, o objetivo da hermenêutica jurídica, explicou, é “demonstrar que a investigação do Direito é um processo criativo, construtivo e concretizador da norma adequada ao caso”. 

Segundo Amaral, os códigos e regras não criam o Direito, mas sim orientam a sua criação. “Para a moderna hermenêutica jurídica, as normas positivas são apenas estruturas linguísticas abertas cujo significado não se deixa colher completamente senão em relação ao caso a decidir e, portanto, por meio de um processo de transformação da norma em regra completa da decisão”. Os juízes e advogados, afirmou o palestrante, dão existência ao Direito pela prática da sua aplicação, sendo ele não “um objeto previamente dado e construído, mas um processo em construção permanente”.
 

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