No segundo debate do projeto Diálogos Criminológicos, do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), realizado no último dia 28 de novembro, o professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Alaor Leite fez observações sobre os crimes de abolição violenta do Estado de Direito e de tentativa de golpe de Estado, abordando o caso recente envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro. “Não é correto, diante de tudo que ocorreu, desconectar o ex-presidente do 8 de janeiro, fazer dele apenas um crítico de pessoas ou mesmo de instituições; cuida-se, isto sim, de pessoa diretamente responsável por atentar de forma violenta contra o Estado de Direito”, afirmou o palestrante.
Ao apresentar Alaor Leite, a diretora Cultural e Atividades Artísticas do IAB e presidente da Sociedade dos Advogados Criminais do Estado do Rio de Janeiro (Sacerj), Marcia Dinis, disse que os estudos dele sobre o Estado Democrático de Direito “são referência obrigatória, tanto pela precisão conceitual quanto pela coragem de enfrentar pontos sensíveis do debate público”. Segundo Dinis, “Alaor tem contribuído para mostrar que a proteção das instituições não passa pelo inflacionamento penal, mas pela coerência constitucional e pela defesa intransigente das liberdades públicas”.
Da esq. para a dir., Ricardo Genelhú, Alaor Leite, Marcia Dinis e Simone Schreiber
Também participaram da mesa a presidente da Comissão de Criminologia do IAB e professora doutora de Criminologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Roberta Duboc Pedrinha, a desembargadora federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) Simone Schreiber e o membro do IAB e pós-doutor pela Universität Hamburg (Alemanha) Ricardo Genelhú.
Roberta Duboc Pedrinha
Roberta Pedrinha falou sobre a relevância do debate: “Não é somente uma reflexão necessária, importante, da maior relevância e atual, como também é urgente, porque, dentro desta quadratura que vivenciamos, assistimos a uma escalada de práticas autoritárias, de fissuras democráticas, que vem modelando o cenário político e econômico aqui no Brasil e o risco que nós acompanhamos de esfacelamento desta democracia”.
Para Ricardo Genelhú, “Alaor Leite dispensa apresentações porque quem não o conhece, sinceramente, não conhece o Direito Penal e não tem um pé na Criminologia”. Genelhú ressaltou que ‘o palestrante consegue concentrar, sendo tão novo − o que é impressionante −, duas qualidades que são muito raras numa pessoa, que são a oratória, ou seja, ele fala muito bem, junto com a capacidade redacional, ele escreve muito bem”.
Ao abordar o argumento dos condenados pela tentativa de golpe de Estado do Brasil, de que tentativa não houve de fato, Alaor Leite disse que “boa parte da discussão doutrinária sobre o início da execução no presente caso é fora de lugar”. Para ele, se há violência ou grave ameaça apta a provocar o segundo resultado, mas que provoque efetivamente a restrição, no mínimo a restrição, do exercício dos poderes constitucionais, então há tentativa: “Quem realiza um ato dessa transcendência, que ocasiona algo no mundo, tenta e não só prepara”.
O professor afirmou que houve grave ameaça no 7 de setembro de 2021, em que o ex-presidente fez um anúncio de desrespeito às decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele também considera ser possível construir um mosaico de ações que geraram um clima que possibilitou as ações, não mais de grave ameaça mas de violência, do 8 de janeiro de 2023. Portanto, segundo ele, “essa correta capitulação é o legado que a decisão do STF está vocacionada a deixar às futuras gerações e à história da jovem democracia brasileira”.
Simone Schreiber agradeceu a Alaor Leite pela clareza e disse que achou “muito interessante toda a sua análise não só sobre os elementos desse tipo penal, mas especialmente sobre o de abolição violenta do Estado de Direito, e de como isso se deu no caso do ex-presidente Jair Bolsonaro”.
