A proposta legislativa, de autoria do deputado federal Orlando Silva (PCdoB), traz como justificativa a reparação de crimes como o ocorrido em maio de 2006 no Estado de São Paulo – ocasião em que mais de 600 pessoas foram mortas, sendo a maioria jovens negros e periféricos. Nesse episódio, a polícia militar paulista promoveu execuções sumárias como resposta a ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC). Da tragédia surgiu o movimento “Mães de Maio”, que dá nome ao PL, cujo objetivo é buscar reparação para mulheres que perderam familiares durante a operação.
O projeto trata de um amplo programa de enfrentamento aos impactos da violência institucional e revitimização de mães e familiares das vítimas e sobreviventes de ações violentas, tendo como seus principais objetivos a transparência e investigação das atividades policiais, a reparação das vítimas e seus familiares, a criação de políticas públicas de prevenção à violência e a responsabilização dos agentes envolvidos. O parecer da Comissão dos Direitos da Mulher, que teve relatoria de Danielle Aguiar Vasconcelos, e o da Comissão de Criminologia, cujo relator foi Rafael De Piro, definem que tais objetivos se coadunam com os valores constitucionais.
Danielle Aguiar Vasconcelos
Segundo Danielle Vasconcelos, ao assegurar amparo jurídico, econômico, social e psicológico para familiares das vítimas de violência, o PL “garante a observância do princípio da dignidade da pessoa humana, tão caro à temática dos direitos humanos”. Citando outras garantias constitucionais, Rafael De Piro também destacou que a proposta, ao prevenir e combater a violência policial, está de acordo com o direito à segurança, à integridade e à vida; ao responsabilizar os agentes que cometerem atos criminosos, se coaduna com o princípio da legalidade, e, ao fornecer assistência integral às vítimas, segue o direito à assistência e à reparação.
De Piro ainda ressaltou que, “além de constituir resposta fundamental às violações de direitos humanos ocorridas no passado, o projeto se reveste de elevada importância ao prever a adoção de medidas (preventivas) destinadas a impedir a reiteração de tais eventos, reconhecendo e valorizando as ‘mães de maio’ como agentes de mudança e defesa dos paradigmas humanitários”. O advogado lembrou que propostas como essa são fundamentais para combater os altos índices de letalidade policial no Brasil, que faz 3,2 vítimas para cada 100 mil habitantes.
Citando o Tema 1.237 de repercussão geral, Vasconcelos afirmou que, além de estar de acordo com o que propõe a Constituição, o projeto “encontra-se em total consonância com a mais atual orientação jurisprudencial a respeito da matéria violência policial”. Segundo a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o Estado é responsável, na esfera cível, por morte ou ferimento decorrente de operações de segurança pública.
Do ponto de vista do recorte de gênero, a análise da Comissão dos Direitos da Mulher também pontua que as mulheres, responsáveis pelo cuidado da casa e da família, são as que mais sofrem com o luto pelas vítimas da violência policial: “Comumente são as mulheres que terão que suportar a consequente carga emocional e financeira decorrente da violência policial cometida contra seus filhos e maridos, principalmente quando estamos falando da camada mais vulnerável da população, a que vive nas periferias”.
Marcia Dinis
A autora da indicação que deu origem aos pareceres, Marcia Dinis, que é presidente da Comissão de Criminologia, também demonstrou apoio ao projeto. Ela afirmou que a proposta tem como grande qualidade a aproximação com os fundamentos do Estado Democrático de Direito. “Além de lutar contra as violências estatais, também temos que prestar auxílio às mães e aos familiares dessas pessoas que são brutalmente assassinadas e que merecem atenção e estrutura”, declarou a advogada.