Na sessão conduzida pelo presidente nacional do Instituto, Sydney Sanches, o parecer foi sustentado pela presidente da Comissão de Criminologia, Marcia Dinis. Ela fez um resumo do parecer, que analisou o projeto de lei 2.213/21, que altera a Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal), de autoria do deputado federal Alex Manente (Cidadania/SP). O parecer será encaminhado ao Congresso Nacional.
Grande parte do parecer está baseado em resoluções do Conselho Federal de Psicologia, editadas no sentido de orientar a atuação dos psicólogos no sistema carcerário, especialmente na produção de documentos nos processos judiciais. Por mais de uma vez, o Conselho se manifestou contra a determinação de que os profissionais da área realizassem laudos criminológicos preditivos na execução penal. Para o CFP, o profissional “somente deverá realizar atividades avaliativas com vistas à individualização da pena quando do ingresso do apenado no sistema prisional”.
A fim de esclarecer sua posição, o CFP divulgou nota técnica afirmando que “não questiona a validade preditiva de instrumentos psicológicos a partir do rigor ético e técnico, somente apresenta a vedação para um tipo de prognóstico, o de reincidência criminal, para o qual, inclusive, de acordo com o Instituto Brasileiro de Avaliação Psicológica (Ibap), não há no Brasil testes validados que possibilitem essa predição”.
Julgamentos morais – Citando a criminóloga carioca Vera Malaguti Batista, os relatores afirmam que “a falta de critérios objetivos e tecnicamente controláveis acaba abrindo espaço para que o perito e, posteriormente, o magistrado, com base no parecer, profiram juízos não-científicos, mas julgamentos morais sobre a vida e as vulnerabilidades do condenado, em um mecanismo de (auto)reprodução de estigmas que congelam a pessoa em uma identidade criminosa”.
Mariana Weigert e Salo de Carvalho ressaltam: “As práticas materializadas nos laudos de prognose delitiva retomam conceitos superados pelo campo criminológico, como propensão ao delito, causas da delinquência e personalidade voltada para o crime. Em realidade, reinstituem ou consolidam discursos de base etiológica que fundem o discurso do direito com o da psiquiatria, regredindo a execução da pena aos primórdios do positivismo naturalista”.
Eles consideram que a proposição encontrada no PL 2.213/21 inverte as diretrizes postas na Constituição, porque, “em razão dos déficits científicos, historicamente a avaliação pericial concentrou-se em juízos morais sobre a individualidade do apenado, quando muito sobre a gravidade do próprio delito que impôs a pena, conformando uma estrutura penal de autor refutada pelo sistema constitucional que garante a inviolabilidade da intimidade e o respeito à vida privada do condenado”.
A questão de fundo enfrentada pelos profissionais da psicologia, segundo os autores do parecer, é relativa à pergunta: seria possível prever a possibilidade de uma pessoa voltar a praticar atos violentos? Salo de Carvalho e Mariana Weigert recorrem à ex-juíza Maria Lucia Karam, para afirmar que “é no mínimo criticável essa capacidade de predição, pois, ‘periculosidade’ não se traduz por qualquer dado objetivo, sendo técnica e concretamente impossível demonstrar que A ou B, psiquicamente capaz ou incapaz, vá ou não realizar uma conduta ilícita no futuro”. Principalmente levando-se em conta o ambiente no qual são realizadas as entrevistas e a própria condição em que vivem os apenados.
A apresentação do PL 2.213/21 foi, em grande parte, motivada pelo recente caso de Lázaro Barbosa de Sousa, que não teria retornado ao presídio após uma saída de Páscoa e, até ser capturado e morto pela polícia, praticou vários crimes. Na verdade, Lázaro de Souza foi recapturado, cumpriu alguns meses de pena e fugiu do presídio em Goiás. O desfecho do caso, portanto, nada teve a ver com qualquer avaliação criminológica.