Segundo Lessa, depois do golpe de 1823, que fechou a Assembleia Constituinte, Pedro I ficou próximo das figuras mais corruptas do País e fomentou ainda mais o processo de escravização: “No reinado dele tivemos o período recordista em desembarque de africanos no porto do Rio de Janeiro. Em um mesmo ano, chegaram a desembarcar 90 mil escravos”. O jornalista lembrou que foi apenas após a saída do monarca que os primeiros sinais de avanço começaram a aparecer. “A lei que dá liberdade para todos os africanos que foram desembarcados depois de 1831 é aprovada após a saída de Pedro I, quando o Regente Feijó assumiu”, explicou ele.
O golpe ainda afastou do Brasil, disse Lessa, figuras importantes para a política e para os debates iluministas da época, como Francisco Gê Acaiaba de Montezuma, o fundador do IAB. Além dele, D. Pedro I perseguiu outros cinco políticos constituintes, dentre eles José Bonifácio. “Quando aprendemos que Bonifácio é o patriarca da independência, não ouvimos que ele foi exilado e banido por seis anos”, disse o autor.
Na abertura do evento, o 1º vice-presidente do IAB, Carlos Eduardo Machado, ressaltou que a obra permite revisitar episódios importantes da história brasileira com um olhar crítico. “Temos visto alguns jornalistas se interessarem por escrever sobre essa área. Esses livros têm uma leitura muito fácil e uma escrita atual, o que gera uma divulgação maior do conhecimento sobre a história do Brasil”, elogiou o advogado.
A linguagem acessível, característica ao texto jornalístico, também foi elogiada pela diretora de Biblioteca do IAB, Marcia Dinis, que mediou o debate. Ela afirmou que o livro traz uma visão pouco falada de um período em que a Coroa estreitou laços com comerciantes de escravos e prendeu deputados. “Essa obra é super interessante porque, em uma linguagem fácil, Lessa questiona o motivo de nós idealizarmos tanto a monarquia”, disse Dinis.
Da esq. para a dir., Isabel Lustosa, Ricardo Lessa, Marcia Dinis, Carlos Eduardo Machado, Bruna Martins e Jorge Rubem Folena
O evento também contou com a participação do membro benemérito do Instituto José Geraldo de Sousa Junior, do secretário-geral do IAB, Jorge Rubem Folena, da doutora em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF) Bruna Martins e da escritora e pesquisadora da Universidade Nova de Lisboa Isabel Lustosa.
José Geraldo de Sousa Junior
José Geraldo de Sousa Junior também destacou que o livro vem ao público com a perspectiva de desentranhar dos discursos o que foi colocado pela tradição da História. Segundo ele, a leitura da publicação, através da figura controversa de D. Pedro I, acentua a necessidade de busca pelo esclarecimento do real papel das figuras históricas brasileiras. “Nessa obra, Ricardo Lessa mais uma vez evidencia a qualidade de sua escrita e a sua aptidão para uma narrativa que é simultaneamente elegante e consistente”, declarou.
Responsável por elaborar em livro um perfil de D. Pedro I, Isabel Lustosa, que chama o monarca de “herói sem nenhum caráter”, enfatizou que o rei era um filho de uma monarquia em queda. “As monarquias absolutistas tinham sido abaladas pela Revolução Francesa e não recuperaram o fôlego. Em um momento de transição, D. Pedro I era um jovem que foi expulso de Portugal com sua família por Napoleão Bonaparte”, contextualizou a historiadora, revelando que até o fim da vida o monarca nutriu fascínio e desejo de ser como o imperador francês.
Especialista em História do Brasil e Império, Bruna Martins sublinhou que O primeiro golpe do Brasil conta com uma pesquisa muito densa e vai na contramão do movimento que reconta e explora o passado brasileiro sem compromisso com a historiografia. “Essa obra é um antídoto à onda de narrativas distorcidas e descompromissadas com a realidade”, afirmou ela. Já Jorge Rubem Folena ressaltou que o livro é uma leitura muito indicada para profissionais do Direito, que precisam ter contato com as raízes da política nacional: “Lessa possibilita que os juristas e cientistas políticos repensem, no debate nacional, qual é a classe dominante neste País e como se forjou a fundação do Estado brasileiro”.