Descrito desde a República Velha, o coronelismo é caracterizado pela coação dos subalternos a direcionarem os votos para candidatos ricos interessados em manter o poder nas elites. Segundo Aieta, esse fenômeno arcaico e, ao mesmo tempo, contemporâneo é também marcado pelo uso da violência e da força para oprimir e controlar o eleitorado. Especialista em Direito Eleitoral, a advogada garantiu que o coronelismo está vigente: “Ele tem outra roupagem, mas existe. Se estabeleceu, ganhou força e está consolidado”.
Para observar os efeitos dessa política, ela afirmou que é preciso direcionar o olhar para as regiões periféricas e para o interior. A advogada apontou que ainda é comum nessas áreas práticas do coronelismo rejeitadas pela lei eleitoral, como a compra de votos. “Nas últimas eleições, tivemos votos vendidos na Baixada Fluminense (RJ) por cerca de R$ 300. Infelizmente, isso já existe no Brasil desde o tempo dos coronéis, que tinham a população subordinada econômica e culturalmente”, afirmou.
A abertura do evento foi conduzida pelo presidente nacional do IAB, Sydney Limeira Sanches, que destacou a parceria da entidade com o IVNL na promoção de debates atuais e relevantes para o universo jurídico. Ele comentou que a discussão sobre as novas formas de manifestação do coronelismo é fundamental nos dias atuais, marcados por um mundo distópico onde o poder é diretamente influenciado pela tecnologia. “O conceito de coronelismo ainda persiste na realidade brasileira, inclusive dentro do sistema eleitoral. Hoje, os coronéis estão modernizados pelas ferramentas tecnológicas, que os permite uma nova roupagem”, afirmou o advogado.
A discussão também contou com a participação do presidente da Comissão de Direito Constitucional do IAB, Miro Teixeira, que fez uma recuperação histórica sobre o tema. O advogado deu destaque aos estudos de Victor Nunes Leal, que, se estivesse vivo, completaria 110 anos este mês. “Ele demonstra em sua obra como o fenômeno foi usado por políticos de todos os matizes, embora depois da Primeira República todos se declarassem republicanos”, pontuou.
Em um contexto em que o voto era direito apenas de homens alfabetizados, Miro Teixeira ressaltou que as oligarquias ainda não estavam satisfeitas com o controle exercido sob o regime eleitoral. “Surge então o recibo do voto, que é na verdade a melhor expressão do voto de cabresto. Imaginem vocês o poder dos coronéis: com o recibo rubricado pelos fiscais, o eleitor exibia o seu voto a quem? Ao coronel”, disse o advogado, definindo a época como uma “farsa democrática”.
Décadas depois, já no meio do século XX, Victor Nunes Leal lança o livro Coronelismo, enxada e voto (1948), onde analisa a política nacional. Na visão de Miro Teixeira, uma das grandes contribuições da obra é a demonstração de que a dominação dos coronéis também se dá por outros recursos, além do dinheiro: “O autor considera a economia rural como uma economia de pouca cultura”. À comunidade jurídica que deseja entender mais sobre o tema, Vânia Aieta também recomendou os escritos de Leal. “Ele nos explica que esse sistema é composto por uma complexa rede de relações que vão desde o coronel até ao presidente da República, envolvendo troca de favores e compromissos recíprocos”, afirmou ela.
A 4ª edição da Semana Victor Nunes Leal, que começou nesta segunda-feira (11/11), terá mais discussões sobre o novo coronelismo na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília (DF), nesta quarta-feira (13/11), quando os trabalhos serão encerrados.