Vivemos tempos disruptivos. A dilapidação de nossas estruturas sociais vem sendo vista, com diferentes matizes, em todo o mundo. Não tem sido fácil aos Estados democratas compreenderem as novas formas relacionais da humanidade, o que vem permitindo o recrudescimento dos discursos de ódio, a intolerância e o avanço do autoritarismo.
Para as gerações que lutaram pelas liberdades constitucionais, depois de um longo e brutal período de regime de exceção e decorridos mais de 30 anos de vigência da Constituição, seria impensável revisitar todo o discurso de defesa da democracia e da dignidade da pessoa humana. Mas, lamentavelmente, tem sido essa a realidade brasileira.
O agravamento da crise institucional, em especial nos últimos meses, com recorrentes ataques às urnas eletrônicas, ao trabalho do Tribunal Superior Eleitoral - TSE, do Supremo Tribunal Federal - STFe de seus ministros e o fomento à disseminação de notícias falsas, tem levado o Instituto dos Advogados Brasileiros - IAB, em linha com sua tradição histórica em defesa da institucionalidade constitucional, a atuar nos limites do espaço público na defesa do Estado Democrático de Direito, acompanhando estreitamente o processo eleitoral.
Por certo, o momento é de atenção ao respeito a regularidade constitucional, mas nessa tarefa cabe sim qualificarmos o discurso e destacar que a sociedade brasileira também almeja uma democracia verdadeiramente social, onde os direitos sociais, os direitos humanos, o respeito as matrizes religiosas, o fim do preconceito, da discriminação de gênero, raça e orientação sexual, a defesa do meio ambiente, os direitos culturais, a busca do pleno emprego, salários justos, a renda distributiva, enfim, um feixe de inúmeras demandas estruturais a serem corrigidas, sejam efetivamente as prioridades dos nossos governantes. O modelo de democracia liberal estabelecido em nossa Carta Política contempla toda essa agenda, o que nos habilita a exigir um estado civilizatório real, sob pena de continuarmos a conviver em uma democracia sujeita aos oportunismos políticos e econômicos.
Como diz o prestigiado filósofo Edmund Burke: “Tudo o que é necessário para o mal triunfar é que os homens de bem não façam nada”. Nesse momento de crucial importância para história brasileira, no qual as instituições comprometidas com a defesa à democracia têm o dever de manter a vigilância e rechaçar qualquer perigo à estabilidade constitucional, o IAB, como exemplo mais candente de histórica liderança democrática, cumpre com sua tradição de vocalizar veementemente contra o arbítrio ou movimento que venha a desaguar na ruptura institucional, na certeza de que não haverá o triunfo das forças retrógradas e contrárias às conquistas civilizatórias. Uma democracia social sólida e solidária deve ser o nosso compromisso permanente!
Sydney Sanches
Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros