O mapeamento dos principais cenários de fiscalidade nos setores energéticos de países lusófonos é uma das tarefas realizadas no livro Fiscalidade das energias convencionais e transição – Angola, Brasil, Moçambique e Portugal, lançado do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) nesta sexta-feira (17/10). Coordenado pelo professor catedrático jubilado da Faculdade de Direito de Coimbra Diogo Leite de Campos e pela diretora jurídica da Helexia Portugal, Alice Khouri, a obra oferece uma visão sobre a evolução dos sistemas fiscais desses territórios diante do papel das energias convencionais e dos desafios da transição climática.
O lançamento aconteceu durante o I Congresso Internacional de Língua Portuguesa em Órgãos de Controle sobre Energia, Transição Climática e Justiça Fiscal, promovido pela Comissão da Advocacia nos Tribunais Superiores e Órgãos de Controle do IAB. Leite de Campos destacou a importância da colaboração entre os países lusófonos para o desenvolvimento do setor energético. “A energia é um elemento fundamental no bem-estar de qualquer sociedade e na produtividade das empresas”, disse ele. Segundo Alice Khouri, o livro inova ao trazer a interdisciplinaridade entre essa área e o Direito Fiscal. “Os coautores são juristas ativos e símbolos de partilha de boas práticas”, enfatizou a advogada.
Na abertura do evento, a presidente nacional do IAB, Rita Cortez, ressaltou que os temas abordados pelos palestrantes estão na ordem do dia dos debates públicos. Responsável pela condução da Comissão da Advocacia nos Tribunais Superiores e Órgãos de Controle do IAB, Fabiola Vianna Morais elogiou o congresso e o lançamento do livro organizado por Leite de Campos e Khouri: “É uma magnífica obra que com certeza irá agregar bastante ao trabalho da comunidade científica e contribuirá com o desenvolvimento do Direito”.
Debates – O Congresso também contou com dois painéis de discussão, que focaram na experiência de Portugal, Angola e Moçambique em questões como a tributação dos produtos petrolíferos, o combate às mudanças climáticas e a transição energética sustentável. Os painéis foram mediados pelo vice-presidente da comissão organizadora, Fábio Luiz Gomes. “Entender o sistema jurídico de outros países permite que acumulemos conhecimento para aprimorar nosso próprio Direito”, disse ele.
A experiência de Portugal foi abordada pelos advogados Francisco de Sousa da Câmara e João Miguel Fernandes, que falaram sobre a tributação dos produtos petrolíferos e a transição energética no país europeu. Ao oferecer um panorama do quadro português, Câmara explicou que “a tributação do petróleo está estruturada em torno da sua cadeia de valor, composta pelas fases de prospecção e extração e de refino e comercialização”.
Fernando pontuou que, com as demandas relacionadas ao ESG, a sustentabilidade tem sido uma preocupação crescente nesse setor. “Temos uma natureza cada vez mais complexa e onerosa do enquadramento tributário dos produtos petrolíferos, com proliferação de contribuições setoriais e aumento do peso de tributos de natureza paracomutativa”, explicou.
Ao falar a respeito da evolução e da modernização da indústria petrolífera em Angola, a jurista especializada em Petróleo e Gás Karina Gonçalves apontou que a exploração do recurso no país começou no início do século XX. “O controle do governo sobre o setor petrolífero começou em 1976, um ano depois da independência, com a criação da estatal Sonangol. Ele foi consolidado e expandido nos anos 1980, com a introdução dos contratos de partilha e produção, amplamente conhecidos no mundo jurídico, que atraem grandes parcerias internacionais até hoje”, enfatizou.
O advogado Rui Gonçalves apontou que em Angola existem várias formas de executar operações petrolíferas, no entanto, nos últimos anos, a única que tem sido efetiva é aquela que se dá através dos contratos de partilha e produção. “Atualmente, a produção de petróleo angolana se encontra em diferentes estágios de pesquisa e desenvolvimento, mas a verdade é que, no momento, a economia está efetivamente em convulsão”, opinou.
Já o cenário de Moçambique foi apresentado pelos professores da Faculdade de Direito da Universidade São Tomás de Moçambique Hamilton Serra de Carvalho e Virgílio Serra de Carvalho, tendo a presidente da Comissão de Direito da Integração do IAB, Elian Araújo, como mediadora do painel.
Do ponto de vista regional, Hamilton afirmou que o ordenamento jurídico moçambicano é muito inspirado no português. “Mas a natureza dos nossos combustíveis fósseis é diferente. Aqui, temos muito gás natural e carvão mineral. Portanto, algumas empresas multinacionais se deslocaram para o país a partir dos anos 2000 com o objetivo de exploração desses recursos”, contou o professor.
O cenário da tributação da exploração petrolífera em Moçambique foi apresentado por Virgílio, que ressaltou que as normas do país tratam de disposições fiscais sem deixar de abordar medidas ambientais. “Quando se fala de petróleo, é preciso ter cautela com muitas questões indiretas, por isso, é necessário que haja a responsabilização daqueles que cometerem danos que possam surgir dessa exploração”, apontou o moçambicano. Na visão de Elian, a experiência do país africano mostra que “pensar a gestão fiscal como ferramenta de justiça ambiental é fundamental, já que é preciso equilibrar o crescimento econômico com a responsabilidade climática”.